quarta-feira, 16 de setembro de 2009

O PROBLEMA DA QUANTIFICAÇÃO DOS ARABISMOS PORTUGUESES

Tomando o léxico português de origem árabe para abalizar a interação das línguas árabe e portuguesa em diferentes fases da história desta última, é importante trazer à tona a velha questão da quantificação deste vocabulário:
Segundo Coelho, há, no máximo, 300 arabismos na língua portuguesa (COELHO apud VASCONCELOS, 1956, p. 299), ao passo que Lopes considera a existência de 400 a 1000 arabismos portugueses (LOPES apud BALDINGER, 1963, p. 54); Ribeiro cita a cifra de 600 vocábulos portugueses de origem árabe, dos quais 2/3 seriam de uso comum (RIBEIRO, 1987, p. 39-40); Nascentes registra 609 arabismos em seu Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa (ELIA, 2004, p. 106); Vasconcelos afirma haver mais de 1000 arabismos na língua portuguesa, número aumentado para mil e tantos, se considerados vocábulos em desuso (VASCONCELOS, 1956, p. 299); Teyssier também crê haver cerca de 1000 arabismos na língua portuguesa, concordando com Machado, que documentou 954 deles na obra Influência Arábica no Vocabulário Português (TEYSSIER, 2001 [1997], p. 22); Franca aponta a existência de mais de 1000 vocábulos portugueses de origem árabe, dos quais apenas 200 ainda seriam bastante usados (FRANCA, 1994, p. 21); Vargens levanta 769 arabismos no Léxico Português de Origem Árabe, mas abordou mais de 3000 em sua tese de doutorado (VARGENS, 2007; VIGUERA MOLINS, 2002, p. 9). Extrapolando o domínio lingüístico português, temos Elcock, segundo o qual havia 4000 arabismos no ibero-romance, muitos dos quais hoje já teriam caído em desuso (ELCOCK apud ELIA, 1974, p. 109), mas Lapesa afirma haver mais de 4000 arabismos no espanhol, sem especificar se a cifra inclui arcaísmos e/ou cultismos (LAPESA, 1991, p. 97), e Piel afirma originar-se na língua árabe 8% do léxico espanhol (PIEL, 1989, p. 10).
Tal divergência quanto ao número de arabismos portugueses (aqui mencionados, a título de referência, os espanhóis, dado que ambas as línguas compartilham parte de sua história) resulta dos critérios utilizados no seu levantamento, como a inclusão do vocabulário de variedades diacrônicas ou diafásicas descritas ou, ainda, a consideração de formas derivadas.

Referências
BALDINGER, K. Los árabes. In: BALDINGER, K. La formación de los dominios lingüisticos en la Peninsula Ibérica. Madrid: Gredos, 1963. p. 53-75. [Biblioteca Románica Hispánica, Dirigida por Damaso Alonso, Tratados y Monografias, 1]
CORRIENTE, F. Diccionario de arabismos y voces afines en iberorromance. 2. ed. ampl. Madrid: Gredos, 2003. [Biblioteca Románica Hispánica, Fundada por Dámaso Alonso, Diccionarios, 22]
CORRIENTE, F. Novedades en le estudio de los arabismos en iberorromance. Revista Española de Lingüística, 26, 1, p. 1-13, 1996.
ELIA, S. Preparação à lingüística românica. Rio de Janeiro: Acadêmica, 1974.
LAPESA, R. Los árabes y el elemento árabe en español. In: LAPESA, R. Historia de la lengua española. Prólogo de Ramón Menéndez Pidal. 9. ed. corregida y aumentada. 7. reimpressión. Madrid: Gredos, 1991. p. 129-156. [Biblioteca Românica Hispânica, Dirigida por Damaso Alonso, Manuales, 45]
LÜDTKE, H. Historia del léxico románico. Versión española de Marcos Martínez Hernández. Madrid: Gredos, 1974.
MACHADO, J. P. Ensaios arábico-portugueses. Lisboa: Notícias, 1997.
MACHADO, J. P. Influência arábica no vocabulário português. Lisboa: Revista de Portugal, 1950. v. 1.
MENÉNDEZ-PIDAL, R. Mis paginas preferidas: estudios lingüísticos e historicos. Madrid: Gredos, 1957. p. 183-206. (Biblioteca Románica Hispánica, dir. por Dámaso Alonso, VI. Antologia Hispánica).
MENÉNDEZ-PIDAL, R. Orígenes del español: estado lingüístico de la Península Ibérica hasta el siglo XI. 3. ed. muy corregida y adicionada. Madrid: Espasa Calpe, 1950. p. 415-440. (Obras Completas, v. VIII).
NIMER, M. Influências orientais na língua portuguesa: os vocábulos árabes, arabizados, persas e turcos (etimologia, aplicações analíticas). Coordenação editorial de Carlos Augusto Calil. 2. ed. revista. São Paulo: EDUSP, 2005.
SILVA NETO, S. da. História da língua portuguesa. 5. ed. Rio de Janeiro: Presença, 1988.
TEYSSIER, P. História da língua portuguesa. Trad. por Celso Cunha. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001. p. 43-44.
VARGENS, J. B. de M. Léxico português de origem árabe: subsídios para os estudos de filologia. Rio Bonito: Almádena, 2007.
VASCONCELOS, C. M. de. Lições de filologia portuguesa. Lisboa: Revista de Portugal, 1956.
VIGUERA MOLINS, M. J. Lengua árabe y lenguas románicas. Revista de Filología Románica, n. 19, p. 15-54, 2002.
WARTBURG, Walther von. La fragmentación lingüística de la Románia. Trad. por Manuel Muñoz Cortés. Madrid: Gredos, 1952. p. 184-186. (Biblioteca Románica Hispánica, dir. por Dámaso Alonso, I. Tratados y Monografias, 1).

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Apresentação

Este blog foi criado para compartilhar informações acerca das conseqüências do contato entre as línguas árabe e portuguesa verificado em 03 contextos específicos: a Península Ibérica medieval, o Brasil escravagista e o Brasil da imigração.
A este tema se dedica a autora deste 1992, quando se apaixonou pelo assunto ao preparar o trabalho de conclusão da disciplina Filologia Românica II (sobre o domínio lingüístico ibérico) na graduação em Letras na Universidade Federal da Bahia.
O referido trabalho, sobre o vocábulo azulejo, descortinou um mundo aparentemente perdido, europeu e medieval, mas que, em verdade, continua vivo no Português Brasileiro, nos arabismos transplantados com o Português Europeu, aos quais se juntaram outros, adquiridos já na Terra Brasilis, por meio de escravos islamizados e de imigrantes arabófonos que ainda hoje chegam ao nosso país.
Os arabismos do Português Brasileiro requerem investigação pautada na etnolingüística e na sociolingüística do contato intercomunitário, complementando o que a literatura especializada já documenta, mas que se restringe aos arabismos ibéricos, mencionando, quando muito, o influxo lexical da migração sírio-libanesa no Brasil.