A parcialidade geralmente verificada na interpretação da conquista da Península Ibérica pelos muçulmanos – e das suas conseqüências – se reflete no estudo dos arabismos.
Há pesquisadores que subestimam o influxo sócio-cultural muçulmano e desta postura ideológica resulta inadequado tratamento dos dados lingüísticos, cujo número de empréstimos árabes efetivamente fazem minguar ou reduzem a vocábulos designativos de referentes da vida rural. Dentre os partidários desta ideologia se encontra Francisco Javier Simonet (1829-1897), catedrático de língua árabe na Universidade de Granada, que chega a procurar no moçárabe influxos românicos (ibéricos) e latinos, como se se negasse a reconhecer-lhe traços tomados ao árabe, invertendo o papel de prestígio social do conquistador face ao conquistado e da direção mais provável do influxo (Glosario de Voces Ibéricas y Latinas Usadas entre los Mozárabes, 1888) (CORRIENTE, 1996, p. 2; MACHADO, 1997, p. 113, 114).
Em José Pedro Machado lê-se, por exemplo, que os muçulmanos deixaram, como vestígio da sua presença em solo posteriormente português, apenas dezenas de vocábulos designativos de objetos de primeira necessidade, que não restaram indícios seguros da cultura dos muçulmanos em Portugal e que só há registro da aprendizagem do árabe pelos portugueses quando estes se estabeleceram no Norte da África. Tais afirmações constituem erro histórico que pode, pela distorção da realidade extralingüística, comprometer a descrição histórica da língua de uma comunidade de fala.
O reducionismo encontra na exaltação do influxo muçulmano a sua antítese. O avançado desenvolvimento técnico-científico dos invasores, o refinamento e o luxo que caracterizam as suas cortes (califados e emirados) maravilham pesquisadores, que creditam ao árabe a fonte de inúmeros hábitos ocidentais – lingüísticos ou não. Destarte, o número de arabismos é ampliado por vocábulos que efetivamente não o são, mas que o desejo de se verem herdeiros de brilhante civilização os fez entender enquanto tal. Dozy é representante característico deste grupo ideológico. Observe-se que, ao revisá-lo, ele aumenta significativamente o número de páginas do Dictionnaire de Engelmann.
Ratifique-se a boa intenção destes pesquisadores, cuja boa-fé não se questiona. Apenas se sugere que estudos mais recentes – e não apenas do âmbito da Lingüística, mas da própria História – possibilitam o “ajuste” do quadro, nos pontos em que os seus pintores carregaram nas tintas ou nos quais o registro de uma versão muito subjetiva da realidade desfigurou o objeto retratado, a ponto de não ser mais possível identificá-lo.
Hoje, conhece-se a amplitude do influxo muçulmano na cultura ibérica medieval, decorrente da situação política de dominador, reforçada pelo efetivo avanço técnico-científico nas mais diversas áreas (Medicina, Agricultura, Artes), creditando-se às comunidades cristã e judaica a diferenciação exclusiva pela fé professada, mas aculturadas e arabizadas nos demais aspectos (como vestuário, culinária e diversão). É de se esperar, portanto, que o influxo resultante deste contato de línguas seja mais expressivo do que o apontado por José Pedro Machado (MACHADO, 1997, p. 113, 114, 117; CORRIENTE, 1996, p. 4-5).
Do ponto de vista lingüístico, o romance andaluz, língua românica, é comum às comunidades cristã e judaica, mas, da estreita convivência destas com a língua e a cultura árabes, adquire numerosos empréstimos lexicais, e, mais tarde, quando se acirra a intolerância religiosa por parte das dinastias norte-africanas almôada e almorávida, e a população moçárabe migra sistematicamente em direção ao norte, tais arabismos do romance andaluz são transmitidos aos falares cristãos setentrionais.
Desconhecem-se estudos sobre arabismos introduzidos no português brasileiro pela imigração de muçulmanos oriundos do próprio Oriente Médio, em diferentes fluxos migratórios conhecidos pela sociedade brasileira, apesar de estes deslocamentos configurarem inegável fato histórico. A literatura especializada registra apenas a introdução de vocabulário da culinária pelos imigrantes sírio-libaneses.
Quanto à contribuição afro-muçulmana ao léxico do português americano, cite-se o estudo de Faris Antônio S. Michaele, Arabismos entre os Africanos na Bahia (1968), com análise de inúmeros arabismos de diferentes campos semânticos (religião, alimentos).
A invasão do Afeganistão e do Iraque pelos Estados Unidos da América, conflitos ininterruptos entre israelenses e os vizinhos libaneses e palestinos e o programa iraniano de enriquecimento de urânio tornaram corriqueiras informações sobre o mundo islâmico nos noticiários internacionais e introduziram, pelo menos no léxico passivo dos falantes de português, vocábulos como jihad, intifada, xador, burca, xariá, sura, dentre outros. Entretanto, nem sempre o falante tem consciência de que se trata de arabismos naturalmente transmitidos à língua portuguesa quando a comunidade que a fala é exposta a informações a respeito do outro, aloglota, cujas especificidades culturais são aprendidas com o vocabulário que as designa.
Compartilha informações sobre o influxo da língua árabe na constituição do léxico português e, particularmente, sobre arabismos legados ao português brasileiro por afro-muçulmanos e por imigrantes árabes e/ou muçulmanos. Traz, ainda, informações acerca da dicionarização de arabismos portugueses pela Lexicografia Brasileira.portuguese arabisms; Brazilian portuguese; dictionarization of arabisms/arabismes portugaises; portugais brésilien; dictionnairisation des arabismes.
quarta-feira, 16 de setembro de 2009
BIBLIOGRAFIA ESPECIALIZADA
Há mais de 200 anos os arabismos constituem tema de investigação. São apresentados, aqui, abreviadamente, alguns autores e obras, organizados conforme configurem textos clássicos, contemporâneos, estrangeiros ou nacionais.
1. Obras Clássicas:
a) Vestígios da Lingua Arabica em Portugal ou Lexikon Etymologico das Palavras e Nomes Portuguezes, que Tem Origem Arabica, publicada em 1789 por Fr. João de Sousa, com segunda edição realizada por José de Santo Antônio Moura em 1830;
b) Cousas arábico-Portuguesas: Algumas Etimologias e Alguns Vocábulos Portugueses de Natureza Religiosa de David Lopes;
c) Dictionnaire des Mots Espagnols et Portugais Derivés de l’Arabe, publicada pelo arabista holandês W. H. Engelmann em 1861, com segunda edição ampliada publicada por Reinhart Dozy;
d) Glosario Etimológico de las Palabras Españolas de Origen Oriental, de Leopoldo de Eguílaz y Yanguas, publicado em 1886 e reeditado em 1974;
e) Ensaios Arábico-Portugueses de José Pedro Machado (1997);
f) Influência arábica no vocabulário português, também de José Pedro Machado (1950, v. 1);
g) Influências Orientais na Língua Portuguesa de Miguel Nimer, originalmente publicada em 1943 (tomo I) e 1944 (tomo II).
Mencione-se, ainda, por freqüentemente serem citadas em pesquisas sobre arabismos, a Arte para Ligeramente saber la lengua arauiga e o Vocabulista Arauigo en Letra Castellana, sobre a língua árabe de Granada, publicadas em volume único em Granada, em 1505, pelo Frei Pedro de Alcalá, com o intuito de otimizar a aprendizagem do árabe por padres envolvidos na catequese de cristãos-novos.
2. Obras Recentes:
a) Diccionario de arabismos y voces afines em iberorromance, de 1999 com segunda edição de 2003. Esta é atualmente a mais importante obra da Filologia Árabo-Românica;
b) Des Premiers Dictionnaires (Jeronimo Cardoso) aux Textes: L’Apport Lexical des Arabismes dans la Langue Portugaise du XVIe Siècle, tese de doutoramento de Myriam Benarroch, defendida em 2000 na França;
c) Iberoromanische Arabismen im Bereich Urbanismus und Wohn Kultur: Sprachliche und kulturhistorische Untersuchungen, tese de doutorado de Yvonne Kiegel-Keicher, foi publicada em janeiro de 2005
d) Arabismos: Uma Mini-Enciclopédia do Mundo Árabe, de Rubem Franca (1994);
e) Dicionário de Termos Árabes da Língua Portuguesa, de Júlio Doin Vieira (2006);
f) Léxico Português de Origem Árabe: Subsídios para os Estudos de Filologia, de João Baptista de Medeiros Vargens (2007).
3. Arabismos de domínios não-ibéricos:
Os arabismos em outros domínios voltaram a ser investigados, como demonstra a obra de Majid El Houssi, Les Arabismes dans la Langue Française (2002), além de teses e artigos com o propósito de revisar verbetes de arabismos de dicionários de grande porte, a exemplo da tese de doutorado de Mostafa Ammadi, sobre arabismos no Diccionario de la Real Academia Española, e os artigos da pesquisadora recentemente falecida Françoise Quinsat, sobre os arabismos na versão eletrônica do Trésor de la Langue Française.
No âmbito das línguas germânicas, uma tese de Doutorado, defendida em 1994 na Universidade de Heidelberg por Raja Tazi, Die Arabismen im Deutschen: lexikalische Interferenzen vom Arabischen ins Deutsche, descreve 200 arabismos alemães de uso comum, dos cerca de 350 previstos para esta língua. O trabalho contextualiza sócio-historicamente a aquisição dos empréstimos pelo alemão e fala dos idiomas que intermediaram o processo.
4. Arabismos no Português Brasileiro:
Uma minuciosa descrição do contato entre árabes e africanos, a islamização/arabização da África e o uso de arabismos por afro-muçulmanos à época da escravidão no Brasil foi feita por Faris Antônio S. Michaele em Arabismos entre os Africanos na Bahia, obra publicada em Curituba, pela editora Requião, em 1968.
Desconhecemos estudos sobre o influxo lexical árabe no português brasileiro em decorrência da imigração mais recente, com predominância de imigrantes muçulmanos. A literatura especializada registra o legado da primeira fase de imigração, sírio-libanesa e majoritariamente cristã, cuja herança lexical é restrita ao campo semântico da culinária.
1. Obras Clássicas:
a) Vestígios da Lingua Arabica em Portugal ou Lexikon Etymologico das Palavras e Nomes Portuguezes, que Tem Origem Arabica, publicada em 1789 por Fr. João de Sousa, com segunda edição realizada por José de Santo Antônio Moura em 1830;
b) Cousas arábico-Portuguesas: Algumas Etimologias e Alguns Vocábulos Portugueses de Natureza Religiosa de David Lopes;
c) Dictionnaire des Mots Espagnols et Portugais Derivés de l’Arabe, publicada pelo arabista holandês W. H. Engelmann em 1861, com segunda edição ampliada publicada por Reinhart Dozy;
d) Glosario Etimológico de las Palabras Españolas de Origen Oriental, de Leopoldo de Eguílaz y Yanguas, publicado em 1886 e reeditado em 1974;
e) Ensaios Arábico-Portugueses de José Pedro Machado (1997);
f) Influência arábica no vocabulário português, também de José Pedro Machado (1950, v. 1);
g) Influências Orientais na Língua Portuguesa de Miguel Nimer, originalmente publicada em 1943 (tomo I) e 1944 (tomo II).
Mencione-se, ainda, por freqüentemente serem citadas em pesquisas sobre arabismos, a Arte para Ligeramente saber la lengua arauiga e o Vocabulista Arauigo en Letra Castellana, sobre a língua árabe de Granada, publicadas em volume único em Granada, em 1505, pelo Frei Pedro de Alcalá, com o intuito de otimizar a aprendizagem do árabe por padres envolvidos na catequese de cristãos-novos.
2. Obras Recentes:
a) Diccionario de arabismos y voces afines em iberorromance, de 1999 com segunda edição de 2003. Esta é atualmente a mais importante obra da Filologia Árabo-Românica;
b) Des Premiers Dictionnaires (Jeronimo Cardoso) aux Textes: L’Apport Lexical des Arabismes dans la Langue Portugaise du XVIe Siècle, tese de doutoramento de Myriam Benarroch, defendida em 2000 na França;
c) Iberoromanische Arabismen im Bereich Urbanismus und Wohn Kultur: Sprachliche und kulturhistorische Untersuchungen, tese de doutorado de Yvonne Kiegel-Keicher, foi publicada em janeiro de 2005
d) Arabismos: Uma Mini-Enciclopédia do Mundo Árabe, de Rubem Franca (1994);
e) Dicionário de Termos Árabes da Língua Portuguesa, de Júlio Doin Vieira (2006);
f) Léxico Português de Origem Árabe: Subsídios para os Estudos de Filologia, de João Baptista de Medeiros Vargens (2007).
3. Arabismos de domínios não-ibéricos:
Os arabismos em outros domínios voltaram a ser investigados, como demonstra a obra de Majid El Houssi, Les Arabismes dans la Langue Française (2002), além de teses e artigos com o propósito de revisar verbetes de arabismos de dicionários de grande porte, a exemplo da tese de doutorado de Mostafa Ammadi, sobre arabismos no Diccionario de la Real Academia Española, e os artigos da pesquisadora recentemente falecida Françoise Quinsat, sobre os arabismos na versão eletrônica do Trésor de la Langue Française.
No âmbito das línguas germânicas, uma tese de Doutorado, defendida em 1994 na Universidade de Heidelberg por Raja Tazi, Die Arabismen im Deutschen: lexikalische Interferenzen vom Arabischen ins Deutsche, descreve 200 arabismos alemães de uso comum, dos cerca de 350 previstos para esta língua. O trabalho contextualiza sócio-historicamente a aquisição dos empréstimos pelo alemão e fala dos idiomas que intermediaram o processo.
4. Arabismos no Português Brasileiro:
Uma minuciosa descrição do contato entre árabes e africanos, a islamização/arabização da África e o uso de arabismos por afro-muçulmanos à época da escravidão no Brasil foi feita por Faris Antônio S. Michaele em Arabismos entre os Africanos na Bahia, obra publicada em Curituba, pela editora Requião, em 1968.
Desconhecemos estudos sobre o influxo lexical árabe no português brasileiro em decorrência da imigração mais recente, com predominância de imigrantes muçulmanos. A literatura especializada registra o legado da primeira fase de imigração, sírio-libanesa e majoritariamente cristã, cuja herança lexical é restrita ao campo semântico da culinária.
CONTRIBUIÇÃO LEXICAL DA IMIGRAÇÃO SÍRIO-LIBANESA AO PORTUGUÊS BRASILEIRO
1. A Imigração Árabe no Brasil
A imigração árabe no Brasil conheceu 02 fluxos de entrada: 1. de árabe cristãos, no período compreendido entre 1860 e 1938, e 2. de árabes muçulmanos, entre os anos de 1945 e 1985 (OSMAN apud MONTENEGRO, 2002, p. 64).
A imigração recente é realizada por palestinos, que constituem 1/3 da população refugiada do mundo, e cuja imigração é caracterizada como de pós-guerra, decorrente da criação do estado de Israel, em 1948, ou em virtude de outras guerras (Guerra dos 06 Dias/1967; Intifada/1987, etc.). É, ainda, uma imigração pautada “em rede”, isto é, intermediada por parentes e amigos (JARDIM, 206, p. 171).
2. O Contato de Línguas e as Conseqüências Lingüísticas do Contato Luso-Árabe no Brasil da Imigração
As línguas em contato, a depender do seu prestígio e de suas funções de uso, designam-se A, a variedade alta (ou H, do ing. High), de prestígio, e B a variedade baixa (ou L, do ing. Low), de menor prestígio (FERGUSON apud TRASK, 2006, p. 82).
Para caracterizar a diglossia, Lüdtke apresenta um esquema (LÜDTKE, 1974, p. 241-242), correlacionando esferas de emprego e categorias em que se classificam as línguas do mundo, que ora aplicaremos ao referido contato no Brasil da imigração (restrita, aqui, conforme já se disse, à imigração de árabes majoritariamente cristãos, de origem sírio-libanesa e hipotetizada para o caso dos árabes muçulmanos).
Esquema de esferas de emprego:
I. Conversação (família, negócios, lugar de trabalho, círculo de amizade).
II. Cultura (ensino geral, rádio, imprensa, livros).
III. Ritual (liturgia, recitação, ensino teórico).
A partir das esferas de emprego, estabelecem-se as seguintes categorias lingüísticas:
I = dialeto; língua espontânea
I + II = língua de cultura espontânea; língua nacional
II + III = língua de cultura codificada
III = língua ritual
Segundo Lüdtke, consideram-se “normais” as seguintes situações lingüísticas (LÜDTKE, 1974, p. 243):
1. Predomínio de uma língua culta espontânea (língua nacional):
I + II
2. Língua culta espontânea empregada simultaneamente como língua ritual:
I + II + III
3. Dialeto e língua culta espontânea:
I / I + II
4. Língua culta espontânea e língua ritual:
I + II / III
5. Dialeto, língua culta espontânea e língua ritual:
I / I + II / III
Constitui efetivamente uma situação diglóssica aquela em que se opõem um dialeto e uma língua culta codificada simultaneamente empregada como língua ritual, ou seja, situação descrita como I / II + III.
Aplicando a proposta de Lüdtke ao uso da língua árabe no Brasil da imigração, tem-se que:
a) entre árabes cristãos, mais facilmente assimilados à sociedade anfitriã e imigrados há mais tempo, verificam-se as seguintes configurações: I (árabe dialetal)/ I + II (português) para as primeiras gerações de imigrantes e I + II (português apenas) para as gerações seguintes;
b) entre árabes muçulmanos, com maior preservação de características lingüístico-culturais, além da religiosa, é de se esperar pelo menos a ocorrência das configurações: I (dialeto árabe)/ I + II (português)/ III (árabe clássico) para a primeira geração; I + II (português) / III (árabe clássico) para as seguintes.
Tarallo e Alkmin apontam duas soluções para o bilingüismo: 1. “bilingüismo estável”, em que se preservam as duas línguas, sem mescla, de que resultam fenômenos como a diglossia e o code-switching (mescla das duas línguas no nível da sentença). 2. retorno ao monolingüismo, com o desaparecimento de uma das línguas em questão (TARALLO, ALKMIN, 1987, p. 12-13).
Entre os imigrantes árabes católicos parece ter se verificado a segunda solução, ao passo que entre os muçulmanos um maior número de relações estabelecidas entre a língua portuguesa e diversas variedades diatópicas e diastráticas do árabe são passíveis de coexistência, mas isto ainda está sujeito a pesquisa de campo, motivo pelo qual preferimos deixar em aberto a questão, levantando apenas possíveis hipóteses para investigação futura.
3. A herança lexical sírio-libanesa
Do total de 769 vocábulos registrados como entrada em verbetes do Vocabulário Português de Origem Árabe (Vargens, 2007), apenas 12 são empréstimos tomados ao árabe dos imigrantes sírios e libaneses aqui chegados nos séculos XIX e XX, o que corresponde a 1,56 % dos arabismos documentados na referida obra. A Figura 01 a seguir descreve a proporção de cada fonte étnica na transmissão de arabismos para a variedade americana da língua portuguesa.
Figura 01 – Fontes étnico-religiosas de arabismos no PB.
Fonte/Quantidade
No de Vocábulos
Percentual
Colonizador Português
732
95,19%
Afro-Muçulmanos
25
3,25 %
Imigrantes Árabes e/ou Muçulmanos
12
1,56 %
TOTAL
769
100
Todos os vocábulos legados ao português brasileiro pelos imigrantes sírios e libaneses integram o campo semântico da culinária. Os verbetes aqui apresentados foram extraídos de Vargens (2007).
Baba hanuche – S.m. [do ár. bābā gannūğ, ‘papai dengoso’, expressão introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Pasta de berinjela, com alho, azeite, limão e sal. Var. babarranuje.
Beleua – S.f. [do ár. baqlāwa(t), palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Doce foliado, à base de nozes, com mel, água de rosas e manteiga. Var. belewa.
Cafta – S. f. [do ár. kufta(t), pelo árabe dialetal kafta, ‘croquete, bolinho de carne’, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Iguaria árabe, muito apreciada no Brasil, à base de carne moída, temperada com cebola, pimenta, hortelã e sal, assada no espeto ou no tabuleiro. Var. kafta. No séc. XX.
Esfiha – S.f. [do ár. isfīha(t), ‘esfiha’, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Bras. Iguaria árabe, síria e libanesa, com massa de farinha de trigo e recheio de carne com tempero variados. Var. esfia, esfirra. A palavra é própria do árabe dialetal da Síria e do Líbano, porém já é atestada em dicionários árabes. No séc. XX.
Falafel – S.m. [do ár. falāfil, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Bolinho com massa de grão-de-bico, com temperos, frito.
Homos – S.m. [do ár. hommus, ‘grãp-de-bico’, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Pasta de grão-de-bico, temperada com azeite, alho, sal e salsa. Var. homus.
Laban – S.f. [do ár. laban, ‘leite, coalhada’, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Coalhada.
Labna – S.f. [do ár. labana(t), palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Coalhada seca.
Mijadra – S.f. [do ár. muğaddara(t), pelo árabe dialetal mižaddara, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Arroz com lentilha, servido com cebola frita no azeite.
Quibe – S.m. [do ár. kibba(t), ‘quibe’]. Iguaria da culinária árabe, típica da Síria e do Líbano, geralmente feita de carne moída e de trigo integral. Var. kibe. No séc. XX, Dicionário Etimológico Nova Fronteira, p. 654.
Tabule – S.m. S.f. [do ár. ‘tabbūla(t), ‘tabule’, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Salada com trigo, tomate, salsa, cebola, sal e limão. Especialidade da cozinha síria e libanesa. No séc. XIX ou XX. Essa palavra é usada, principalmente, na região do Líbano e da Síria.
Tahine – S.m. [do ár. tahīn, ‘farinha’, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Farinha.
REFERÊNCIAS
CRYSTAL, D. Dicionário de lingüística e fonética. Traduzido e adaptado por Maria Carmelita Pádua Dias. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1988.
FÍGOLI, L. H. G.; VILELA, E. M. Migração internacional, multiculturalismo e identidade: sírios e libaneses em Minas Gerais. XIV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, Caxambu/MG, 20 a 24 de setembro de 2004.
FRANCA, R. Arabismos: uma mini-enciclopédia do mundo árabe. Recife: Prefeitura da Cidade do Recife/EDUFPE, 1994.
HEYE, J. Sociolingüística. In: RECTOR, M. Manual de lingüística. Petrópolis: Vozes, 1979. p. 203-237.
JARDIM, D. F. Os imigrantes palestinos na América Latina. Estudos Avançados, 20 (57), p. 171-181, 2006.
LÜDTKE, H. Historia del léxico románico. Versión española de Marcos Martínez Hernández. Madrid: Gredos, 1974.
MONTENEGRO, S. M. Identidades muçulmanas no Brasil: entre o arabismo e a islamização. Lusotopie, n. 2, p. 59-79, 2002.
NEUVEU, F. Dicionário de ciências da linguagem. Trad. por Albertina Cunha e José Antônio Nunes. Petrópolis: Vozes, 2008.
TRASK, R. L. Dicionário de linguagem e lingüística. Trad. e adapt. por Rodolfo Ilari. Revisão técnica por Ingedore Koch e Thaïs Cristóforo Silva. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2006.
VARGENS, J. B. de M. Léxico português de origem árabe: subsídios para os estudos de filologia. Rio Bonito: Almádena, 2007.
VARGENS, J. B. de M; LOPES, N. Islamismo e negritude: da África para o Brasil, da Idade Média aos nossos dias. Rio de Janeiro: UFRJ, 1982.
VIEIRA, J. D. Dicionário de termos árabes da língua portuguesa. Florianópolis: EDUFSC, 2006.
WANIEZ, P.; BRUSTLEIN, V. Os muçulmanos no Brasil: elementos para uma geografia social. ALCEU, v. 1, n. 2, p. 155-180, jan./jul. 2001.
WARDHAUGH, R. An introduction to sociolinguistics. 2. ed. Oxford: Blackwell, 1992.
WEINREICH, U. Languages in contact. 5. ed. The Hague: Mouton, 1967.
A imigração árabe no Brasil conheceu 02 fluxos de entrada: 1. de árabe cristãos, no período compreendido entre 1860 e 1938, e 2. de árabes muçulmanos, entre os anos de 1945 e 1985 (OSMAN apud MONTENEGRO, 2002, p. 64).
A imigração recente é realizada por palestinos, que constituem 1/3 da população refugiada do mundo, e cuja imigração é caracterizada como de pós-guerra, decorrente da criação do estado de Israel, em 1948, ou em virtude de outras guerras (Guerra dos 06 Dias/1967; Intifada/1987, etc.). É, ainda, uma imigração pautada “em rede”, isto é, intermediada por parentes e amigos (JARDIM, 206, p. 171).
2. O Contato de Línguas e as Conseqüências Lingüísticas do Contato Luso-Árabe no Brasil da Imigração
As línguas em contato, a depender do seu prestígio e de suas funções de uso, designam-se A, a variedade alta (ou H, do ing. High), de prestígio, e B a variedade baixa (ou L, do ing. Low), de menor prestígio (FERGUSON apud TRASK, 2006, p. 82).
Para caracterizar a diglossia, Lüdtke apresenta um esquema (LÜDTKE, 1974, p. 241-242), correlacionando esferas de emprego e categorias em que se classificam as línguas do mundo, que ora aplicaremos ao referido contato no Brasil da imigração (restrita, aqui, conforme já se disse, à imigração de árabes majoritariamente cristãos, de origem sírio-libanesa e hipotetizada para o caso dos árabes muçulmanos).
Esquema de esferas de emprego:
I. Conversação (família, negócios, lugar de trabalho, círculo de amizade).
II. Cultura (ensino geral, rádio, imprensa, livros).
III. Ritual (liturgia, recitação, ensino teórico).
A partir das esferas de emprego, estabelecem-se as seguintes categorias lingüísticas:
I = dialeto; língua espontânea
I + II = língua de cultura espontânea; língua nacional
II + III = língua de cultura codificada
III = língua ritual
Segundo Lüdtke, consideram-se “normais” as seguintes situações lingüísticas (LÜDTKE, 1974, p. 243):
1. Predomínio de uma língua culta espontânea (língua nacional):
I + II
2. Língua culta espontânea empregada simultaneamente como língua ritual:
I + II + III
3. Dialeto e língua culta espontânea:
I / I + II
4. Língua culta espontânea e língua ritual:
I + II / III
5. Dialeto, língua culta espontânea e língua ritual:
I / I + II / III
Constitui efetivamente uma situação diglóssica aquela em que se opõem um dialeto e uma língua culta codificada simultaneamente empregada como língua ritual, ou seja, situação descrita como I / II + III.
Aplicando a proposta de Lüdtke ao uso da língua árabe no Brasil da imigração, tem-se que:
a) entre árabes cristãos, mais facilmente assimilados à sociedade anfitriã e imigrados há mais tempo, verificam-se as seguintes configurações: I (árabe dialetal)/ I + II (português) para as primeiras gerações de imigrantes e I + II (português apenas) para as gerações seguintes;
b) entre árabes muçulmanos, com maior preservação de características lingüístico-culturais, além da religiosa, é de se esperar pelo menos a ocorrência das configurações: I (dialeto árabe)/ I + II (português)/ III (árabe clássico) para a primeira geração; I + II (português) / III (árabe clássico) para as seguintes.
Tarallo e Alkmin apontam duas soluções para o bilingüismo: 1. “bilingüismo estável”, em que se preservam as duas línguas, sem mescla, de que resultam fenômenos como a diglossia e o code-switching (mescla das duas línguas no nível da sentença). 2. retorno ao monolingüismo, com o desaparecimento de uma das línguas em questão (TARALLO, ALKMIN, 1987, p. 12-13).
Entre os imigrantes árabes católicos parece ter se verificado a segunda solução, ao passo que entre os muçulmanos um maior número de relações estabelecidas entre a língua portuguesa e diversas variedades diatópicas e diastráticas do árabe são passíveis de coexistência, mas isto ainda está sujeito a pesquisa de campo, motivo pelo qual preferimos deixar em aberto a questão, levantando apenas possíveis hipóteses para investigação futura.
3. A herança lexical sírio-libanesa
Do total de 769 vocábulos registrados como entrada em verbetes do Vocabulário Português de Origem Árabe (Vargens, 2007), apenas 12 são empréstimos tomados ao árabe dos imigrantes sírios e libaneses aqui chegados nos séculos XIX e XX, o que corresponde a 1,56 % dos arabismos documentados na referida obra. A Figura 01 a seguir descreve a proporção de cada fonte étnica na transmissão de arabismos para a variedade americana da língua portuguesa.
Figura 01 – Fontes étnico-religiosas de arabismos no PB.
Fonte/Quantidade
No de Vocábulos
Percentual
Colonizador Português
732
95,19%
Afro-Muçulmanos
25
3,25 %
Imigrantes Árabes e/ou Muçulmanos
12
1,56 %
TOTAL
769
100
Todos os vocábulos legados ao português brasileiro pelos imigrantes sírios e libaneses integram o campo semântico da culinária. Os verbetes aqui apresentados foram extraídos de Vargens (2007).
Baba hanuche – S.m. [do ár. bābā gannūğ, ‘papai dengoso’, expressão introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Pasta de berinjela, com alho, azeite, limão e sal. Var. babarranuje.
Beleua – S.f. [do ár. baqlāwa(t), palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Doce foliado, à base de nozes, com mel, água de rosas e manteiga. Var. belewa.
Cafta – S. f. [do ár. kufta(t), pelo árabe dialetal kafta, ‘croquete, bolinho de carne’, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Iguaria árabe, muito apreciada no Brasil, à base de carne moída, temperada com cebola, pimenta, hortelã e sal, assada no espeto ou no tabuleiro. Var. kafta. No séc. XX.
Esfiha – S.f. [do ár. isfīha(t), ‘esfiha’, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Bras. Iguaria árabe, síria e libanesa, com massa de farinha de trigo e recheio de carne com tempero variados. Var. esfia, esfirra. A palavra é própria do árabe dialetal da Síria e do Líbano, porém já é atestada em dicionários árabes. No séc. XX.
Falafel – S.m. [do ár. falāfil, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Bolinho com massa de grão-de-bico, com temperos, frito.
Homos – S.m. [do ár. hommus, ‘grãp-de-bico’, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Pasta de grão-de-bico, temperada com azeite, alho, sal e salsa. Var. homus.
Laban – S.f. [do ár. laban, ‘leite, coalhada’, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Coalhada.
Labna – S.f. [do ár. labana(t), palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Coalhada seca.
Mijadra – S.f. [do ár. muğaddara(t), pelo árabe dialetal mižaddara, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Arroz com lentilha, servido com cebola frita no azeite.
Quibe – S.m. [do ár. kibba(t), ‘quibe’]. Iguaria da culinária árabe, típica da Síria e do Líbano, geralmente feita de carne moída e de trigo integral. Var. kibe. No séc. XX, Dicionário Etimológico Nova Fronteira, p. 654.
Tabule – S.m. S.f. [do ár. ‘tabbūla(t), ‘tabule’, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Salada com trigo, tomate, salsa, cebola, sal e limão. Especialidade da cozinha síria e libanesa. No séc. XIX ou XX. Essa palavra é usada, principalmente, na região do Líbano e da Síria.
Tahine – S.m. [do ár. tahīn, ‘farinha’, palavra introduzida no português pelos imigrantes sírios e libaneses no Brasil]. Farinha.
REFERÊNCIAS
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VIEIRA, J. D. Dicionário de termos árabes da língua portuguesa. Florianópolis: EDUFSC, 2006.
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WARDHAUGH, R. An introduction to sociolinguistics. 2. ed. Oxford: Blackwell, 1992.
WEINREICH, U. Languages in contact. 5. ed. The Hague: Mouton, 1967.
LEGADO AFRO-MUÇULMANO
1. A Presença de Afro-Muçulmanos na Bahia
Segundo Luiz Viana Filho, a periodização do comércio negreiro na Bahia divide-se em 04 ciclos: 1. ciclo da Guiné (a partir da segunda metade do século XVI); 2. ciclo de Angola (no século XVII); 3. ciclo da Costa da Mina e do Golfo do Benin (do século XVIII até 1815) e 4. fase da ilegalidade (1816-1851). Pierre Verger altera parcialmente tal periodização, subdividindo o terceiro ciclo em dois: 3.1. ciclo da Costa da Mina (três primeiros quartos do século XVIII) e 3.2. ciclo da baía do Benin (de 1770 a 1850) (OLIVEIRA, 1997, p. 40).
A partir das últimas décadas do século XVIII e ao longo do século XIX, foi o Sudão Central, região interiorana em relação à Baía do Benin, a procedência de africanos islamizados (hauçás, nupes, iorubás, bornos, borgus, etc.) levados como escravos para a Bahia, como conseqüência da jihad promovida, a partir de 1804, pelo xeque Usman dan Fodio, fundador do Califado de Sokoto, de cujas guerras expansionistas resultou o cativeiro de habitantes das áreas próximas à baía do Benin, particularmente no período compreendido entre os anos de 1804 e 1810. Assim, a presença de escravos islamizados na Bahia está relacionada a complexo desdobramento da História da África, em que se misturam religião e política, uma jihad e disputas por expansão territorial (LOVEJOY, 2000, p. 11-12).
Embora fossem os hauçás os africanos mais intensamente islamizados, os iorubás os sobrepunham, em muito, numericamente. Quanto à islamização dos escravos, depoimentos tomados quando da grande revolta malê de 1835 apontam para a sua ocorrência na terra de origem, em geral na infância e em escolas corânicas, com o aprendizado também da língua árabe (REIS, 1996, p. 9-10).
2. O Contato de Línguas e as Conseqüências Lingüísticas do Contato Luso-Árabe no Brasil Escravagista
À época da escravidão, no Brasil, sobretudo na Bahia, verificou-se o translado forçado de muçulmanos, que ali se aglomeraram. Além da migração, a interação entre escravos, seus administradores e senhores propiciou o contato entre dois grupos sociais étnico-lingüístico-culturalmente distintos.
A língua árabe, no contexto do Brasil escravagista, não viria a conhecer o prestígio que tivera em Al-Ândalus, o domínio político dos muçulmanos na Península Ibérica medieval, em que constituía a língua do conquistador, e onde tivera tão ampla difusão que, com efeito, tornara-se a língua inclusive das comunidades moçárabe e judaica, cujas próprias línguas tiveram o seu uso restrito à intimidade do lar e a contextos menos formais de comunicação (CORRIENTE, 1996, p. 5-6).
No Brasil, o árabe era língua conhecida por alguns membros de grupo social sem qualquer prestígio cultural ou sócio-econômico, e o seu uso parece ter se restringido ao campo religioso, uma vez que documentos produzidos neste idioma se tratam, em geral, de reproduções de versos corânicos, orações islâmicas, amuletos, etc. O seu domínio variava entre bom domínio, como apontam textos encontrados no Arquivo Público do Estado da Bahia e editados criticamente por Reichert no final dos anos 60, e domínio menos eficaz, de modo a resultar em textos multilingües, apesar de grafados com caracteres árabes ocidentais, e nos quais, além do árabe, os autores deixam transparecer línguas africanas, maternas ou línguas segundas, de maior difusão na África, e, eventualmente, o português (REICHERT, 1966, 1967, 1968; DOBRONRAVIN, 2004).
Assim, documentalmente, o árabe entre os escravos, no Brasil, era a língua da religião por eles professada, o islamismo, caracterizando-se, portanto, pela especialização de sua função.
Na coexistência, as “variedades lingüísticas” se caracterizam por diferente valoração na avaliação social, que se reflete na especialização das suas funções de uso. Designa-se A a variedade alta (ou H, do ing. High), de prestígio, e B a variedade baixa (ou L, do ing. Low), que recebe menor valoração social (FERGUSON apud TRASK, 2006, p. 82).
A língua árabe em que o corão foi escrito constitui a língua clássica, referência de aprendizagem escolar e referência estilística. Desconhecemos descrições do uso cotidiano de uma variedade diatópica da língua árabe entre os escravos, no Brasil, o que dificulta a configuração, com precisão, da relação entre as línguas árabe e portuguesa, aqui. Aparentemente sem uso expandido na própria comunidade escrava, conhecida antes por alguns de seus membros que dominavam ainda a escrita, não seria correto, talvez, afirmar que o árabe constituísse uma variedade B, em oposição à língua portuguesa, que seria a variedade A, de prestígio.
Certo é que a criminalização do árabe e do islamismo decorreu da associação destes às revoltas escravas ocorridas na Bahia nas primeiras décadas do século XIX, o que concorreu para o seu declínio, sendo que, um século mais tarde, os descendentes dos escravos afro-muçulmanos haviam sido absorvidos pelos candomblés ((QUIRING-ZOCHE, 2004, p. 232), supondo-se, na esteira, a perda do conhecimento da língua árabe.
Lüdtke, para caracterizar a diglossia, apresenta um esquema (LÜDTKE, 1974, p. 241-242), correlacionando esferas de emprego e categorias em que se classificam as línguas do mundo, conforme especificado a seguir.
Esquema de esferas de emprego:
I. Conversação (família, negócios, lugar de trabalho, círculo de amizade).
II. Cultura (ensino geral, rádio, imprensa, livros).
III. Ritual (liturgia, recitação, ensino teórico).
A partir das esferas de emprego, estabelecem-se as categorias lingüísticas:
I = dialeto; língua espontânea
I + II = língua de cultura espontânea; língua nacional
II + III = língua de cultura codificada
III = língua ritual
Segundo Lüdtke, consideram-se “normais” as seguintes situações lingüísticas (LÜDTKE, 1974, p. 243):
1. Predomínio de uma língua culta espontânea (língua nacional):
I + II
2. Língua culta espontânea empregada simultaneamente como língua ritual:
I + II + III
3. Dialeto e língua culta espontânea:
I / I + II
4. Língua culta espontânea e língua ritual:
I + II / III
5. Dialeto, língua culta espontânea e língua ritual:
I / I + II / III
Diglossia é uma situação particular, menos freqüente, em que se opõem um dialeto e uma língua culta codificada que também é empregada como língua ritual, isto é: I / II + III.
Aplicando a proposta de Lúdtke ao uso da língua árabe no Brasil da escravidão, evidencia-se a sua função exclusiva de língua ritual (III), caracterizando-se o contato luso-árabe pela configuração lingüística I + II (português)/ III (árabe), ou seja, o uso cotidiano da língua nacional e uso restrito do árabe no âmbito religioso.
Observe-se a não configuração, no Brasil, da situação lingüística que caracteriza a diglossia, diferentemente do verificado em Al-Ândalus, onde o árabe ocorria em todas as esferas de emprego (conversação, cultura e ritual, do que constituem prova, por exemplo, conhecidas obras do Pe. Pedro de Alcalá, publicadas em primórdios do século XVI, o vocabulário do árabe de Granada e a gramática da língua árabe elaborada para facilitar a sua aprendizagem por clérigos responsáveis pela catequese de cristãos-novos) e cujas variedades configuram todas as categorias propostas por Lüdtke (dialeto, língua nacional, língua de cultura e língua ritual).
O caráter ritual do árabe entre os afro-muçulmanos levou à sua perda quando da criminalização do islamismo e da sua língua de expressão. Portanto, no Brasil escravagista, a relação português-árabe, se já não se caracterizava pela diglossia, acabou por desaparecer, até que, a partir de 1860, com a chegada de imigrantes sírio-libaneses, generalizadamente designados “turcos”, tivesse início outro capítulo desta história.
3. Arabismos introduzidos no PB por afro-muçulmanos
Encontram-se registrados, no Vocabulário Português de Origem Árabe (VARGENS, 2007), 25 arabismos introduzidos pelos escravos islamizados. Tais vocábulos integram apenas 02 campos semânticos, da religião e da culinária, verificando-se absoluta assimetria na distribuição. O campo religioso se subdivide em 08 micro-campos, ao passo que o campo da culinária registra apenas 01 vocábulo designativo de alimento (aluá), conforme ilustra o quadro a seguir.
Quadro 01 – Campos semânticos dos arabismos introduzidos por afro-muçulmanos no PB.
1. Religião
a) orações: açubá, adixá, aiassari, ailá, alimangariba. (05 itens; 20,83% das ocorrências*)
b) ministros de culto religioso: alicali, alufá, lemano. (03 itens; 12,5% das ocorrências)
c) crente: amim, malê, mussurumim. (03 itens; 12,5% das ocorrências)
d) templo: djema, maçalassi. (02 itens; 8,33% das ocorrências)
e) entidade: aligenum. (01 item; 1,66% das ocorrências)
f) objetos litúrgicos: tecebá. (01 item; 1,66% das ocorrências)
g) saudações e locuções interjetivas: barica da subá, bissimilai, maneco lassalama, sala maleco.
(04 itens; 16,66% das ocorrências)
h) preceitos: assumi, azaca, fazer sala, jihad, sacá. (05 itens; 20,83% das ocorrências)
2. Culinária
a) alimento: aluá. (01 item; 4% das ocorrências)
TOTAL 25 itens lexicais/100% de ocorrências
*Os percentuais dos micro-campos religiosos têm como referência o total de 24 itens do campo religioso, mas o percentual final indica a sua proporção no conjunto de 25 vocábulos introduzidos no português brasileiro pelos escravos islamizados.
4. conclusão
Considerando-se as hipóteses testadas neste breve estudo, a saber, que o legado dos escravos islamizados, no que concerne à introdução de arabismos no português brasileiro, não é numeroso e se restringe ao campo semântico da religião, concluiu-se pela corroboração das mesmas, haja vista o registro de 25 vocábulos legados pelos “malês”, dentre os 769 arabismos documentados na obra-fonte, perfazendo apenas 3,25% do total e a inserção de 96% dos arabismos “malês” no campo semântico da religião, ou seja, 24 vocábulos, dentre os 25 encontrados, integram o referido campo.
REFERÊNCIAS
CARNEIRO, E. (org.). Antologia do negro brasileiro: de Joaquim Nabuco a Jorge Amado, os textos mais significativos sobre a presença do negro em nosso país. Rio de Janeiro, 2005.
CORRIENTE, F. Novedades en le estudio de los arabismos en iberorromance. Revista Española de Lingüística, 26, 1, p. 1-13, 1996.
CRYSTAL, D. Dicionário de lingüística e fonética. Traduzido e adaptado por Maria Carmelita Pádua Dias. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1988.
DOBRONRAVIN, N. Escritos multilingües em caracteres árabes: novas fontes de Trinidad e Brasil no século XIX, Afro-Ásia, n. 31, p. 297-326, 2004.
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LÜDTKE, H. Historia del léxico románico. Madrid: Gredos, 1974.
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OLIVEIRA, M. I. C. de. Quem eram os “negros da Guiné”? A origem africana dos escravos na Bahia. Afro-Ásia, n. 19/20, p. 37-73, 1997.
PAUL, H. Principles of the history of language. Translated from the second edition of the original by H. A. Strong. Maryland: McGrath, 1970.
QUIRING-ZOCHE, R. Luta religiosa ou luta política? O levante dos malês da Bahia segundo uma fonte islâmica, Afro-Ásia, n. 19-20, p. 229-238, 1997.
REICHERT, R. Os documentos árabes do Arquivo Público do Estado da Bahia – 3ª série, Afro-Ásia, n. 6-7, 1968.
REICHERT, R. Os documentos árabes do Arquivo Público do Estado da Bahia – 2ª série, Afro-Ásia, n. 4-5, 1967.
REICHERT, R. Os documentos árabes do Arquivo do Estado da Bahia, Afro-Ásia, n. 2-3, 1966.
REIS J. J. A revolta dos Malês em 1835. Disponível em: www.smec.salvador.ba.gov.br/documentos/a-revolta-dos-males.pdf. Acesso em: 17 jul. 2006.
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WARDHAUGH, R. An introduction to sociolinguistics. 2. ed. Oxford: Blackwell, 1992.
WEINREICH, U. Languages in contact. 5. ed. The Hague: Mouton, 1967.
Segundo Luiz Viana Filho, a periodização do comércio negreiro na Bahia divide-se em 04 ciclos: 1. ciclo da Guiné (a partir da segunda metade do século XVI); 2. ciclo de Angola (no século XVII); 3. ciclo da Costa da Mina e do Golfo do Benin (do século XVIII até 1815) e 4. fase da ilegalidade (1816-1851). Pierre Verger altera parcialmente tal periodização, subdividindo o terceiro ciclo em dois: 3.1. ciclo da Costa da Mina (três primeiros quartos do século XVIII) e 3.2. ciclo da baía do Benin (de 1770 a 1850) (OLIVEIRA, 1997, p. 40).
A partir das últimas décadas do século XVIII e ao longo do século XIX, foi o Sudão Central, região interiorana em relação à Baía do Benin, a procedência de africanos islamizados (hauçás, nupes, iorubás, bornos, borgus, etc.) levados como escravos para a Bahia, como conseqüência da jihad promovida, a partir de 1804, pelo xeque Usman dan Fodio, fundador do Califado de Sokoto, de cujas guerras expansionistas resultou o cativeiro de habitantes das áreas próximas à baía do Benin, particularmente no período compreendido entre os anos de 1804 e 1810. Assim, a presença de escravos islamizados na Bahia está relacionada a complexo desdobramento da História da África, em que se misturam religião e política, uma jihad e disputas por expansão territorial (LOVEJOY, 2000, p. 11-12).
Embora fossem os hauçás os africanos mais intensamente islamizados, os iorubás os sobrepunham, em muito, numericamente. Quanto à islamização dos escravos, depoimentos tomados quando da grande revolta malê de 1835 apontam para a sua ocorrência na terra de origem, em geral na infância e em escolas corânicas, com o aprendizado também da língua árabe (REIS, 1996, p. 9-10).
2. O Contato de Línguas e as Conseqüências Lingüísticas do Contato Luso-Árabe no Brasil Escravagista
À época da escravidão, no Brasil, sobretudo na Bahia, verificou-se o translado forçado de muçulmanos, que ali se aglomeraram. Além da migração, a interação entre escravos, seus administradores e senhores propiciou o contato entre dois grupos sociais étnico-lingüístico-culturalmente distintos.
A língua árabe, no contexto do Brasil escravagista, não viria a conhecer o prestígio que tivera em Al-Ândalus, o domínio político dos muçulmanos na Península Ibérica medieval, em que constituía a língua do conquistador, e onde tivera tão ampla difusão que, com efeito, tornara-se a língua inclusive das comunidades moçárabe e judaica, cujas próprias línguas tiveram o seu uso restrito à intimidade do lar e a contextos menos formais de comunicação (CORRIENTE, 1996, p. 5-6).
No Brasil, o árabe era língua conhecida por alguns membros de grupo social sem qualquer prestígio cultural ou sócio-econômico, e o seu uso parece ter se restringido ao campo religioso, uma vez que documentos produzidos neste idioma se tratam, em geral, de reproduções de versos corânicos, orações islâmicas, amuletos, etc. O seu domínio variava entre bom domínio, como apontam textos encontrados no Arquivo Público do Estado da Bahia e editados criticamente por Reichert no final dos anos 60, e domínio menos eficaz, de modo a resultar em textos multilingües, apesar de grafados com caracteres árabes ocidentais, e nos quais, além do árabe, os autores deixam transparecer línguas africanas, maternas ou línguas segundas, de maior difusão na África, e, eventualmente, o português (REICHERT, 1966, 1967, 1968; DOBRONRAVIN, 2004).
Assim, documentalmente, o árabe entre os escravos, no Brasil, era a língua da religião por eles professada, o islamismo, caracterizando-se, portanto, pela especialização de sua função.
Na coexistência, as “variedades lingüísticas” se caracterizam por diferente valoração na avaliação social, que se reflete na especialização das suas funções de uso. Designa-se A a variedade alta (ou H, do ing. High), de prestígio, e B a variedade baixa (ou L, do ing. Low), que recebe menor valoração social (FERGUSON apud TRASK, 2006, p. 82).
A língua árabe em que o corão foi escrito constitui a língua clássica, referência de aprendizagem escolar e referência estilística. Desconhecemos descrições do uso cotidiano de uma variedade diatópica da língua árabe entre os escravos, no Brasil, o que dificulta a configuração, com precisão, da relação entre as línguas árabe e portuguesa, aqui. Aparentemente sem uso expandido na própria comunidade escrava, conhecida antes por alguns de seus membros que dominavam ainda a escrita, não seria correto, talvez, afirmar que o árabe constituísse uma variedade B, em oposição à língua portuguesa, que seria a variedade A, de prestígio.
Certo é que a criminalização do árabe e do islamismo decorreu da associação destes às revoltas escravas ocorridas na Bahia nas primeiras décadas do século XIX, o que concorreu para o seu declínio, sendo que, um século mais tarde, os descendentes dos escravos afro-muçulmanos haviam sido absorvidos pelos candomblés ((QUIRING-ZOCHE, 2004, p. 232), supondo-se, na esteira, a perda do conhecimento da língua árabe.
Lüdtke, para caracterizar a diglossia, apresenta um esquema (LÜDTKE, 1974, p. 241-242), correlacionando esferas de emprego e categorias em que se classificam as línguas do mundo, conforme especificado a seguir.
Esquema de esferas de emprego:
I. Conversação (família, negócios, lugar de trabalho, círculo de amizade).
II. Cultura (ensino geral, rádio, imprensa, livros).
III. Ritual (liturgia, recitação, ensino teórico).
A partir das esferas de emprego, estabelecem-se as categorias lingüísticas:
I = dialeto; língua espontânea
I + II = língua de cultura espontânea; língua nacional
II + III = língua de cultura codificada
III = língua ritual
Segundo Lüdtke, consideram-se “normais” as seguintes situações lingüísticas (LÜDTKE, 1974, p. 243):
1. Predomínio de uma língua culta espontânea (língua nacional):
I + II
2. Língua culta espontânea empregada simultaneamente como língua ritual:
I + II + III
3. Dialeto e língua culta espontânea:
I / I + II
4. Língua culta espontânea e língua ritual:
I + II / III
5. Dialeto, língua culta espontânea e língua ritual:
I / I + II / III
Diglossia é uma situação particular, menos freqüente, em que se opõem um dialeto e uma língua culta codificada que também é empregada como língua ritual, isto é: I / II + III.
Aplicando a proposta de Lúdtke ao uso da língua árabe no Brasil da escravidão, evidencia-se a sua função exclusiva de língua ritual (III), caracterizando-se o contato luso-árabe pela configuração lingüística I + II (português)/ III (árabe), ou seja, o uso cotidiano da língua nacional e uso restrito do árabe no âmbito religioso.
Observe-se a não configuração, no Brasil, da situação lingüística que caracteriza a diglossia, diferentemente do verificado em Al-Ândalus, onde o árabe ocorria em todas as esferas de emprego (conversação, cultura e ritual, do que constituem prova, por exemplo, conhecidas obras do Pe. Pedro de Alcalá, publicadas em primórdios do século XVI, o vocabulário do árabe de Granada e a gramática da língua árabe elaborada para facilitar a sua aprendizagem por clérigos responsáveis pela catequese de cristãos-novos) e cujas variedades configuram todas as categorias propostas por Lüdtke (dialeto, língua nacional, língua de cultura e língua ritual).
O caráter ritual do árabe entre os afro-muçulmanos levou à sua perda quando da criminalização do islamismo e da sua língua de expressão. Portanto, no Brasil escravagista, a relação português-árabe, se já não se caracterizava pela diglossia, acabou por desaparecer, até que, a partir de 1860, com a chegada de imigrantes sírio-libaneses, generalizadamente designados “turcos”, tivesse início outro capítulo desta história.
3. Arabismos introduzidos no PB por afro-muçulmanos
Encontram-se registrados, no Vocabulário Português de Origem Árabe (VARGENS, 2007), 25 arabismos introduzidos pelos escravos islamizados. Tais vocábulos integram apenas 02 campos semânticos, da religião e da culinária, verificando-se absoluta assimetria na distribuição. O campo religioso se subdivide em 08 micro-campos, ao passo que o campo da culinária registra apenas 01 vocábulo designativo de alimento (aluá), conforme ilustra o quadro a seguir.
Quadro 01 – Campos semânticos dos arabismos introduzidos por afro-muçulmanos no PB.
Campo Semântico
1. Religião
a) orações: açubá, adixá, aiassari, ailá, alimangariba. (05 itens; 20,83% das ocorrências*)
b) ministros de culto religioso: alicali, alufá, lemano. (03 itens; 12,5% das ocorrências)
c) crente: amim, malê, mussurumim. (03 itens; 12,5% das ocorrências)
d) templo: djema, maçalassi. (02 itens; 8,33% das ocorrências)
e) entidade: aligenum. (01 item; 1,66% das ocorrências)
f) objetos litúrgicos: tecebá. (01 item; 1,66% das ocorrências)
g) saudações e locuções interjetivas: barica da subá, bissimilai, maneco lassalama, sala maleco.
(04 itens; 16,66% das ocorrências)
h) preceitos: assumi, azaca, fazer sala, jihad, sacá. (05 itens; 20,83% das ocorrências)
2. Culinária
a) alimento: aluá. (01 item; 4% das ocorrências)
TOTAL 25 itens lexicais/100% de ocorrências
*Os percentuais dos micro-campos religiosos têm como referência o total de 24 itens do campo religioso, mas o percentual final indica a sua proporção no conjunto de 25 vocábulos introduzidos no português brasileiro pelos escravos islamizados.
4. conclusão
Considerando-se as hipóteses testadas neste breve estudo, a saber, que o legado dos escravos islamizados, no que concerne à introdução de arabismos no português brasileiro, não é numeroso e se restringe ao campo semântico da religião, concluiu-se pela corroboração das mesmas, haja vista o registro de 25 vocábulos legados pelos “malês”, dentre os 769 arabismos documentados na obra-fonte, perfazendo apenas 3,25% do total e a inserção de 96% dos arabismos “malês” no campo semântico da religião, ou seja, 24 vocábulos, dentre os 25 encontrados, integram o referido campo.
REFERÊNCIAS
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CORRIENTE, F. Novedades en le estudio de los arabismos en iberorromance. Revista Española de Lingüística, 26, 1, p. 1-13, 1996.
CRYSTAL, D. Dicionário de lingüística e fonética. Traduzido e adaptado por Maria Carmelita Pádua Dias. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1988.
DOBRONRAVIN, N. Escritos multilingües em caracteres árabes: novas fontes de Trinidad e Brasil no século XIX, Afro-Ásia, n. 31, p. 297-326, 2004.
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PAUL, H. Principles of the history of language. Translated from the second edition of the original by H. A. Strong. Maryland: McGrath, 1970.
QUIRING-ZOCHE, R. Luta religiosa ou luta política? O levante dos malês da Bahia segundo uma fonte islâmica, Afro-Ásia, n. 19-20, p. 229-238, 1997.
REICHERT, R. Os documentos árabes do Arquivo Público do Estado da Bahia – 3ª série, Afro-Ásia, n. 6-7, 1968.
REICHERT, R. Os documentos árabes do Arquivo Público do Estado da Bahia – 2ª série, Afro-Ásia, n. 4-5, 1967.
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REIS, J. J. Identidade e diversidade étnicas nas irmandades negras no tempo da escravidão. Tempo, v. 2, n. 3, p. 7-33, 1996.
VARGENS, J. B. de M. Léxico português de origem árabe: subsídios para os estudos de filologia. Rio Bonito: Almádena, 2007.
VARGENS, J. B. de M; LOPES, N. Islamismo e negritude: da África para o Brasil, da Idade Média aos nossos dias. Rio de Janeiro: UFRJ, 1982.
WARDHAUGH, R. An introduction to sociolinguistics. 2. ed. Oxford: Blackwell, 1992.
WEINREICH, U. Languages in contact. 5. ed. The Hague: Mouton, 1967.
ARABISMOS DO CAMPO SEMÂNTICO "RELIGIÃO"
1. Introdução
Este texto tem por objeto os arabismos portugueses do campo semântico religioso, com o intuito de conhecer os micro-campos em que se organizam e a sua origem: herança européia ou aquisição do português brasileiro.
Os arabismos aqui estudados foram extraídos da obra Léxico Português de Origem Árabe: Subsídios para os Estudos de Filologia (VARGENS, 2007).
A hipótese principal deste estudo é a de que a contribuição afro-muçulmana é quantitativamente menor do que a herança européia, sendo a hipótese secundária a de que os arabismos legados por escravos islamizados ocorrem em pequeno número de micro-campos do campo religioso, restringindo-se especificamente aos de ministros do culto islâmico e de orações, e refletindo apenas particularidades do culto islâmico “malê”.
2. Arabismos do campo semântico religião
Os arabismos portugueses do campo religioso se subdividem, aqui, em 14 micro-campos: 01. Ministros do Culto Islâmico, que compreende não só o clero, mas juristas islâmicos encarregados do cumprimento das orientações corânicas nas sociedades muçulmanas, além de fundadores de mosteiros; 02. Crentes e Infiéis, considerando-se diferentes acepções para muçulmanos e não-muçulmanos; 03. Religiões e Seitas; 04. Preceitos, incluindo tributos e jejuns; 05. Locais Sagrados ou a Estes Relacionados, com as acepções relacionadas aos locais de culto e a especificidades destes; 06. Livro Sagrado, com as acepções para o Corão, suas partes e para a Hadith, compilação da tradição sobre ditos e feitos de Maomé; 07. Objetos Litúrgicos, com os demais objetos de culto, como paramento e terço; 08. Orações; 09. Divindade e Outras Entidades, incluindo-se a divindade suprema, outras entidades e designação de graus destas; 10. Eventos; 11. Morte, com acepções relacionadas a funeral; 12. Segregação Religiosa, com delimitação espacial dos grupos religiosos cristão e muçulmano; 13. Premiação e Punição; 14. Saudações, Interjeições, Expressões Interjetivas.
Informam-se, a seguir, os vocábulos encontrados, destacando-se com negrito aqueles legados ao PB por afro-muçulmanos, o número total de vocábulos por micro-campo, o número de vocábulos introduzidos pelos malês e, enfim, o percentual de vocábulos com origem malê
______
Quadro 01 – Origem “malê” dos arabismos por micro-campo religioso.
_____
a) Ministros do Culto Islâmico
aba, alfaqui, alicali, almuadem, alufá, arabi, caciz, imame, lemano, marabuto, miramolim, mufti, ulemá, xeque. (14, 03, 21,42%)
b) Crentes e Infiéis
alcoranista, almóada, almorávida, amim, babi, cafre, darôes, elche, faquir, hadji, malê, maronita, moçárabe, mogatace, mosleme, muçulmano, mudéjar, mussurumim, rafadi, rume, sufi, sunita, xerife, xiita.
(24, 03, 12,50%)
c) Religiões e Seitas
almôada, almorávida, babismo, islame, maronita, muçulmanismo, sufismo, xiismo.
(08, 00, 00 %)
d) Preceitos
assumi, azaca, jihad, sacá. (04, 04, 100%)
e) Locais Sagrados ou a Estes Relacionados
açotéia, alcorão, almádena, alquibla, caaba, djema, maçalassi, marabuto, mesquita, mimbar, minarete, mirabe. (12, 02, 16,66%)
f) Livro Sagrado
alcorão, moçafo, suna, sura. (04, 00, 00%)
g) Objetos Litúrgicos
acitara, alfaia, almocela, Caaba, tecebá. (05, 01, 20%)
h) Orações
açubá, adixá, aiassari, ailá, alimangariba, fazer sala, salá. (07, 06, 85,71%)
i) Divindade e Outras Entidades
abedale, Alá, aligenum, caneco, djim, ifrite. (06, 01, 16,66%)
j) Eventos
hégira. (01, 00, 00%)
k) Morte
almocábar, ataúde. (02, 00, 00%)
l) Segregação Religiosa
aduana, almocábar. (02, 00, 00%)
m) Premiação e Punição
aljube, huri. (02,00, 00%)
n) Saudações, Interjeições, Expressões Interjetivas
Barica da subá, Bissimilai, Maneco lassalama, Oxalá, Salamaleco, Salamaleque.
(06, 04, 66,66%)
TOTAL 96 vocábulos, 24 legados por afro-muçulmanos ou 25% do total
__________________
Quadro 02 – Arabismos do campo religioso.*,**
aba, abedale, acitara, açotéia, açubá*, adixá, aduana, aiassari, ailá, Alá, alcorão(2x)**, alcoranista, alfaia, alfaqui, alicali, aligenum, alimangariba, aljube, almádena, almóada(2x), almocábar, almocela, almorávida(2x), almuadem, alquibla, alufá, amim, arabi, assumi, ataúde, azaca, babi, babismo, Barica da subá, Bissimilai, Caaba(2x), caciz, cafre, caneco, daroês, djema, djim, elche, faquir, fazer sala, hadji, hégira, huri, ifrite, imame, islame, jihad, lemano, maçalassi, malê, Maneco lassalama, marabuto(2x), maronita(2x), mesquita, mimbar, minarete, mirabe, miramolim, moçafo, moçárabe, mogatace, mosleme, muçulmano, muçulmanismo, mudéjar, mufti, mussurumim, Oxalá, rafadi, rume, sacá, salá, Salamaleco, Salamaleque, sufi, sufismo, suna, sunita, sura, tecebá, ulemá, xeque, xerife, xiita, xiismo.
* Vocábulo introduzido no PB por afro-muçulmanos.
**Vocábulos integram 02 micro-campos distintos.
3. Conclusões
Concluiu-se pela refutação parcial da hipótese testada, com a efetiva contribuição afro-muçulmana menor do que a dos vocábulos transplantados para o Brasil pelo colonizador português: 1/4 dos arabismos religiosos ou 24 vocábulos/expressões árabes foram introduzidas pelos escravos muçulmanos, dos 96 arabismos registrados (25 % do total), verificando-se, entretanto, maior quantidade de micro-campos semânticos em que estes ocorrem do que o inicialmente previsto (08 micro-campos, dos 14 considerados ou 57,14 % destes). Com efeito, em alguns desses micro-campos a contribuição “malê” constitui a totalidade dos vocábulos integrantes (100 % dentre os do micro-campo dos preceitos religiosos) ou a maioria deles (a exemplo dos micro-campos das orações e das saudações, em que constituem, respectivamente, 85,71 % e 66,66 % dos itens léxicos registrados).
4. Referências
BELTRÃO, L. O Islã, a cultura e a língua árabes na África Negra. Afroásia, n. 8/9, p. 41-49, 1969.
COSERIU, E. Principios de semántica estructural. Madrid: Gredos, 1977.
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MARANHÃO, S de M. Arabismos no português brasileiro (II): a herança dos imigrantes árabes e/ou muçulmanos. SEMANA DE HUMANIDADES DA UFC E SEMANA DE HUMANIDADES DA UECE (VI). Comunicação. Fortaleza, Universidade Federal do Ceará, 27 a 29 de abril de 2009.
MARANHÃO, S de M. Arabismos Portugueses - um exemplo do século XV: os arabismos nas receitas de medicamentos e nos regimentos relativos à saúde do Livro da Cartuxa. Salvador, 1996. 34 f. Trabalho Acadêmico (Disciplina Contato de Línguas e Mudanças Lingüísticas na România). Mestrado em Letras, Instituto de Letras, Universidade Federal da Bahia
MICHAËLIS: Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Melhoramentos, 1998. (Dicionários Michaëlis)
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THORAVAL, Y. Diccionario de civilización musulmana. Barcelona: Planeta/Larousse, 1996.
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Este texto tem por objeto os arabismos portugueses do campo semântico religioso, com o intuito de conhecer os micro-campos em que se organizam e a sua origem: herança européia ou aquisição do português brasileiro.
Os arabismos aqui estudados foram extraídos da obra Léxico Português de Origem Árabe: Subsídios para os Estudos de Filologia (VARGENS, 2007).
A hipótese principal deste estudo é a de que a contribuição afro-muçulmana é quantitativamente menor do que a herança européia, sendo a hipótese secundária a de que os arabismos legados por escravos islamizados ocorrem em pequeno número de micro-campos do campo religioso, restringindo-se especificamente aos de ministros do culto islâmico e de orações, e refletindo apenas particularidades do culto islâmico “malê”.
2. Arabismos do campo semântico religião
Os arabismos portugueses do campo religioso se subdividem, aqui, em 14 micro-campos: 01. Ministros do Culto Islâmico, que compreende não só o clero, mas juristas islâmicos encarregados do cumprimento das orientações corânicas nas sociedades muçulmanas, além de fundadores de mosteiros; 02. Crentes e Infiéis, considerando-se diferentes acepções para muçulmanos e não-muçulmanos; 03. Religiões e Seitas; 04. Preceitos, incluindo tributos e jejuns; 05. Locais Sagrados ou a Estes Relacionados, com as acepções relacionadas aos locais de culto e a especificidades destes; 06. Livro Sagrado, com as acepções para o Corão, suas partes e para a Hadith, compilação da tradição sobre ditos e feitos de Maomé; 07. Objetos Litúrgicos, com os demais objetos de culto, como paramento e terço; 08. Orações; 09. Divindade e Outras Entidades, incluindo-se a divindade suprema, outras entidades e designação de graus destas; 10. Eventos; 11. Morte, com acepções relacionadas a funeral; 12. Segregação Religiosa, com delimitação espacial dos grupos religiosos cristão e muçulmano; 13. Premiação e Punição; 14. Saudações, Interjeições, Expressões Interjetivas.
Informam-se, a seguir, os vocábulos encontrados, destacando-se com negrito aqueles legados ao PB por afro-muçulmanos, o número total de vocábulos por micro-campo, o número de vocábulos introduzidos pelos malês e, enfim, o percentual de vocábulos com origem malê
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Quadro 01 – Origem “malê” dos arabismos por micro-campo religioso.
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a) Ministros do Culto Islâmico
aba, alfaqui, alicali, almuadem, alufá, arabi, caciz, imame, lemano, marabuto, miramolim, mufti, ulemá, xeque. (14, 03, 21,42%)
b) Crentes e Infiéis
alcoranista, almóada, almorávida, amim, babi, cafre, darôes, elche, faquir, hadji, malê, maronita, moçárabe, mogatace, mosleme, muçulmano, mudéjar, mussurumim, rafadi, rume, sufi, sunita, xerife, xiita.
(24, 03, 12,50%)
c) Religiões e Seitas
almôada, almorávida, babismo, islame, maronita, muçulmanismo, sufismo, xiismo.
(08, 00, 00 %)
d) Preceitos
assumi, azaca, jihad, sacá. (04, 04, 100%)
e) Locais Sagrados ou a Estes Relacionados
açotéia, alcorão, almádena, alquibla, caaba, djema, maçalassi, marabuto, mesquita, mimbar, minarete, mirabe. (12, 02, 16,66%)
f) Livro Sagrado
alcorão, moçafo, suna, sura. (04, 00, 00%)
g) Objetos Litúrgicos
acitara, alfaia, almocela, Caaba, tecebá. (05, 01, 20%)
h) Orações
açubá, adixá, aiassari, ailá, alimangariba, fazer sala, salá. (07, 06, 85,71%)
i) Divindade e Outras Entidades
abedale, Alá, aligenum, caneco, djim, ifrite. (06, 01, 16,66%)
j) Eventos
hégira. (01, 00, 00%)
k) Morte
almocábar, ataúde. (02, 00, 00%)
l) Segregação Religiosa
aduana, almocábar. (02, 00, 00%)
m) Premiação e Punição
aljube, huri. (02,00, 00%)
n) Saudações, Interjeições, Expressões Interjetivas
Barica da subá, Bissimilai, Maneco lassalama, Oxalá, Salamaleco, Salamaleque.
(06, 04, 66,66%)
TOTAL 96 vocábulos, 24 legados por afro-muçulmanos ou 25% do total
__________________
Quadro 02 – Arabismos do campo religioso.*,**
aba, abedale, acitara, açotéia, açubá*, adixá, aduana, aiassari, ailá, Alá, alcorão(2x)**, alcoranista, alfaia, alfaqui, alicali, aligenum, alimangariba, aljube, almádena, almóada(2x), almocábar, almocela, almorávida(2x), almuadem, alquibla, alufá, amim, arabi, assumi, ataúde, azaca, babi, babismo, Barica da subá, Bissimilai, Caaba(2x), caciz, cafre, caneco, daroês, djema, djim, elche, faquir, fazer sala, hadji, hégira, huri, ifrite, imame, islame, jihad, lemano, maçalassi, malê, Maneco lassalama, marabuto(2x), maronita(2x), mesquita, mimbar, minarete, mirabe, miramolim, moçafo, moçárabe, mogatace, mosleme, muçulmano, muçulmanismo, mudéjar, mufti, mussurumim, Oxalá, rafadi, rume, sacá, salá, Salamaleco, Salamaleque, sufi, sufismo, suna, sunita, sura, tecebá, ulemá, xeque, xerife, xiita, xiismo.
* Vocábulo introduzido no PB por afro-muçulmanos.
**Vocábulos integram 02 micro-campos distintos.
3. Conclusões
Concluiu-se pela refutação parcial da hipótese testada, com a efetiva contribuição afro-muçulmana menor do que a dos vocábulos transplantados para o Brasil pelo colonizador português: 1/4 dos arabismos religiosos ou 24 vocábulos/expressões árabes foram introduzidas pelos escravos muçulmanos, dos 96 arabismos registrados (25 % do total), verificando-se, entretanto, maior quantidade de micro-campos semânticos em que estes ocorrem do que o inicialmente previsto (08 micro-campos, dos 14 considerados ou 57,14 % destes). Com efeito, em alguns desses micro-campos a contribuição “malê” constitui a totalidade dos vocábulos integrantes (100 % dentre os do micro-campo dos preceitos religiosos) ou a maioria deles (a exemplo dos micro-campos das orações e das saudações, em que constituem, respectivamente, 85,71 % e 66,66 % dos itens léxicos registrados).
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BELTRÃO, L. O Islã, a cultura e a língua árabes na África Negra. Afroásia, n. 8/9, p. 41-49, 1969.
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THORAVAL, Y. Diccionario de civilización musulmana. Barcelona: Planeta/Larousse, 1996.
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VARGENS, J. B. M. Léxico português de origem árabe: subsídios para os estudos de filologia. Rio Bonito: Almádena, 2007.
TERMINOLOGIA
Na descrição de contextos de contato que elucidam a presença de arabismos na língua portuguesa, a literatura especializada recorre ao vocabulário da Filologia Árabo-Românica e da Sociolingüística do contato intercomunitário, aqui sistematizado:
Al-Ândalus: Entidade política arábico-islâmica na Península Ibérica medieval (711 a 1492), equivocadamente designada Espanha Muçulmana. Aponta-se como preferível a forma Alandalus, pronúncia nativa e local do referido topônimo.
Andalusino: Natural ou habitante de Al-Ândalus; referente a Al-Ândalus.
Andaluz: Natural ou habitante da atual Andaluzia (Espanha); referente à Andaluzia.
Bilingüismo: Fenômeno individual caracterizado pelo uso alternado de línguas distintas por um mesmo falante.
Contato de línguas: situação em que línguas distintas se influenciam, devido à contigüidade geográfica, proximidade social, conquistas e migrações ou mesmo em decorrência de viagens ou de exposição a meios de comunicação de massa.
Diglossia: Fenômeno social caracterizado pelo uso de duas línguas, em funções socialmente estabelecidas como adequadas para cada uma delas, designando-se A a variedade de prestígio e B a variedade de menor prestígio.
Espanha Muçulmana: Al-ândalus. A designação Espanha Muçulmana é equivocada, dado reunir conceitos excludentes: a Espanha é cristã, Al-Ândalus, muçulmano.
Hispano-árabe: Andalusino, forma preferível, por se considerar a designação hispano-árabe uma “etiqueta distorcedora”.
Interferência: fenômeno verificado em falantes bilíngües e caracterizado pela reorganização de padrões de um sistema lingüístico devido à introdução, neste, de elementos de outro sistema.
Malê: Denominação genérica do negro muçulmano no Brasil. Etnônimo atribuído por outras etnias a africanos islamizados e, por isso, tem seu uso criticado.
Moçárabe: Cristãos arabizados que permaneceram sob jugo muçulmano em Al-Ândalus.
Mudéjar: Muçulmanos que permaneceram na Península Ibérica após a Reconquista cristã.
Muladi: Muçulmano de origem étnica hispânica, convertido depois da conquista islâmica de Al-Ândalus, ou descendente de um autóctone convertido.
Romance andalusino: Romandalusino ou romance meridional, equivocadamente dito moçárabe, por não ser de uso restrito da comunidade moçárabe.
Romance hispânico: Designação do conjunto de falares resultantes da natural evolução da língua latina na Hispania, antiga província romana.
Romance meridional: Romance andalusino ou romance meridional
Romandalusino: Romance andalusino ou meridional, designação preferível à moçárabe.
Romania Arabica: Espaço lingüístico-cultural em que a língua árabe trava contato com romances e línguas novilatinas. Engloba diferentes territórios e se estende por várias épocas. termo cunhado por hispano-arabistas centro-europeus, dentre os quais A. Steiger.
Referências
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Al-Ândalus: Entidade política arábico-islâmica na Península Ibérica medieval (711 a 1492), equivocadamente designada Espanha Muçulmana. Aponta-se como preferível a forma Alandalus, pronúncia nativa e local do referido topônimo.
Andalusino: Natural ou habitante de Al-Ândalus; referente a Al-Ândalus.
Andaluz: Natural ou habitante da atual Andaluzia (Espanha); referente à Andaluzia.
Bilingüismo: Fenômeno individual caracterizado pelo uso alternado de línguas distintas por um mesmo falante.
Contato de línguas: situação em que línguas distintas se influenciam, devido à contigüidade geográfica, proximidade social, conquistas e migrações ou mesmo em decorrência de viagens ou de exposição a meios de comunicação de massa.
Diglossia: Fenômeno social caracterizado pelo uso de duas línguas, em funções socialmente estabelecidas como adequadas para cada uma delas, designando-se A a variedade de prestígio e B a variedade de menor prestígio.
Espanha Muçulmana: Al-ândalus. A designação Espanha Muçulmana é equivocada, dado reunir conceitos excludentes: a Espanha é cristã, Al-Ândalus, muçulmano.
Hispano-árabe: Andalusino, forma preferível, por se considerar a designação hispano-árabe uma “etiqueta distorcedora”.
Interferência: fenômeno verificado em falantes bilíngües e caracterizado pela reorganização de padrões de um sistema lingüístico devido à introdução, neste, de elementos de outro sistema.
Malê: Denominação genérica do negro muçulmano no Brasil. Etnônimo atribuído por outras etnias a africanos islamizados e, por isso, tem seu uso criticado.
Moçárabe: Cristãos arabizados que permaneceram sob jugo muçulmano em Al-Ândalus.
Mudéjar: Muçulmanos que permaneceram na Península Ibérica após a Reconquista cristã.
Muladi: Muçulmano de origem étnica hispânica, convertido depois da conquista islâmica de Al-Ândalus, ou descendente de um autóctone convertido.
Romance andalusino: Romandalusino ou romance meridional, equivocadamente dito moçárabe, por não ser de uso restrito da comunidade moçárabe.
Romance hispânico: Designação do conjunto de falares resultantes da natural evolução da língua latina na Hispania, antiga província romana.
Romance meridional: Romance andalusino ou romance meridional
Romandalusino: Romance andalusino ou meridional, designação preferível à moçárabe.
Romania Arabica: Espaço lingüístico-cultural em que a língua árabe trava contato com romances e línguas novilatinas. Engloba diferentes territórios e se estende por várias épocas. termo cunhado por hispano-arabistas centro-europeus, dentre os quais A. Steiger.
Referências
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CAMPOS SEMÂNTICOS
A literatura especializada em Filologia Românica ou Portuguesa contempla sobretudo o estudo do contato luso-árabe à Idade Média ibérica, quando se deu a importação de maior número de vocábulos da língua árabe, distribuído em ampla gama de campos semânticos, abrangendo aspectos da vida cotidiana, das ciências e das técnicas e mesmo da religião.
Entretanto, o português brasileiro também incorporou arabismos, devido à presença de afro-muçulmanos na sociedade escravagista nos séculos XVIII e XIX, com a predominância quase absoluta de arabismos do campo religioso.
No Léxico Português de Origem Árabe (VARGENS, 2007), não se considerando formas derivadas e compostas apresentadas como subentradas em seus verbetes, estão registrados 769 arabismos portugueses. Destes, 25 foram legados pelos escravos ditos “malês”, perfazendo 3,25% dos arabismos documentados na referida obra. Apenas 01 pertence ao campo da culinária (aluá, designando alimentos, doce e bebida), os demais pertencem ao campo religioso e estão distribuídos em 08 micro-campos: 1. orações (açubá, adixá, aiassari, ailá, alimangariba); 2. ministros de culto religioso (alicali, alufá, lemano); 3. crente (amim, malê, mussurumim); 4. preceitos (assumi, azaca, fazer sala, jihad, sacá); 5. templo (djema, maçalassi); 6. entidade (aligenum); 7. objetos litúrgicos (tecebá) e 8. saudações e locuções interjetivas (barica da subá, bissimilai, maneco lassalama, sala maleco).
O enriquecimento lexical proporcionado por imigrantes árabes e/ou muçulmanos ao português brasileiro ainda não foi devidamente investigado. Essa imigração teve início na segunda metade do século XIX, mas ainda está em curso, com a chegada mais recentemente de palestinos, por exemplo. Ainda assim, a literatura especializada em lingüística cita apenas o legado sírio-libanês, dos primórdios dessa migração, de modo que qualquer afirmação sobre a contribuição de imigrantes árabes e/ou muçulmanos ao sistema lexical da variedade americana da língua portuguesa é precipitada, seja pela possível desatualização dos dados, dada a falta de pesquisas nas áreas de contato luso-árabe mais intenso (PR, RS), seja pelo fato de a literatura especializada datar já de algumas décadas.
Assim, com os dados de que dispomos agora, e a partir dos arabismos registrados no Léxico Português de Origem Árabe (VARGENS, 2007), temos que apenas 12 vocábulos são empréstimos tomados ao árabe dos imigrantes sírio-libaneses, contribuição esta que perfaz 1,56 % dos arabismos documentados na referida obra. Todos integram o campo semântico da culinária (baba hanuche, beleua, cafta, esfiha, falafel, homos, laban, labna, mijadra, quibe, tabule, tahine).
O Léxico Português de Origem Árabe (VARGENS, 2007) registra, além da herança afro-muçulmana e sírio-libanesa, outros 732 arabismos chegados ao Brasil com a língua do colonizador, o português europeu, e que constituem 96,75% do total dos registros.
Vejamos agora os campos semânticos em que, segundo diferentes estudiosos da língua portuguesa, organizam-se os arabismos portugueses. Considerando-se os campos citados por Elia (ELIA, 2004, p. 107), Houaiss (HOUAISS, 1986), Silva (SILVA, 2003), Silva Neto (SILVA NETO, 1988, p. 333), Teyssier (TEYSSIER, 2001, p. 22), Vargens (VARGENS, 2007, p. 221-225) e Vasconcelos (1956, p. 301-302), encontra-se o referido vocabulário nos campos semânticos de:
1. técnicas e produtos agrícolas: açude, almuinha, safra, sega; açúcar, café, tamarindo.
2. guerra e vida militar: alferes, algema, almirante, arrais, arsenal, bodoque, calibre, refém.
3. indústria e comércio: açougue, alambique, armazém, azenha, azêmola.
4. administração e finanças: aduana, alfândega, alvará, aval, leilão, tarifa.
5. profissões: alfaiate, almoxarife, magarefe.
6. ciências, técnicas e artes: algarismo, álgebra, zero; achaque, elixir, enxaqueca, nuca, xarope; alquimia; alaúde, atabaque, atambor, axabeba, cifra.
7. vestuário: babuche.
8. alimentação e culinária: almôndega, cuscuz.
9. compartimentalização espacial e acidentes geográficos: aldeia, arrabalde, bairro, rincão.
10. habitação e vida doméstica: alcova, alicerce, almofada, andaime, azulejo, chafariz, divã, saguão, sofá, taça, taipa.
11. fauna (inclusive pesca): anta, atum, gazela, girafa.
12. jogos: xadrez.
13. religião: imame, ulemá, mussurumim, islame, jihad, mesquita, minarete, moçafo, tecebá.
Observa-se a presença de vocábulos de origem árabe em ampla gama de áreas nas quais a cultura muçulmana deixou traços. Segundo Houaiss (HOUAISS, 1986), das cerca de 3200 palavras existentes no português primitivo, 2300 seriam herança latina, 800 seriam arabismos e apenas 106 resultariam de empréstimos germânicos. Vasconcelos reitera a importância numérica e “cultur-histórica” desses arabismos, em suas palavras os mais “notáveis” entre os elementos não latinos da língua portuguesa (VASCONCELOS, 1956, p. 299).
Silva, Teyssier e Vasconcelos vêem no contato prolongado, durante a Idade Média, e no refinamento cultural do conquistador muçulmano, que concorreu para a evolução das ciências, das técnicas e das artes mais variadas, em solo ibérico, a interferência do árabe no desenvolvimento das línguas ali em uso (SILVA, 2003; TEYSSIER, 2001, p. 22; VASCONCELOS, 1956, p. 299).
Referências
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No Léxico Português de Origem Árabe (VARGENS, 2007), não se considerando formas derivadas e compostas apresentadas como subentradas em seus verbetes, estão registrados 769 arabismos portugueses. Destes, 25 foram legados pelos escravos ditos “malês”, perfazendo 3,25% dos arabismos documentados na referida obra. Apenas 01 pertence ao campo da culinária (aluá, designando alimentos, doce e bebida), os demais pertencem ao campo religioso e estão distribuídos em 08 micro-campos: 1. orações (açubá, adixá, aiassari, ailá, alimangariba); 2. ministros de culto religioso (alicali, alufá, lemano); 3. crente (amim, malê, mussurumim); 4. preceitos (assumi, azaca, fazer sala, jihad, sacá); 5. templo (djema, maçalassi); 6. entidade (aligenum); 7. objetos litúrgicos (tecebá) e 8. saudações e locuções interjetivas (barica da subá, bissimilai, maneco lassalama, sala maleco).
O enriquecimento lexical proporcionado por imigrantes árabes e/ou muçulmanos ao português brasileiro ainda não foi devidamente investigado. Essa imigração teve início na segunda metade do século XIX, mas ainda está em curso, com a chegada mais recentemente de palestinos, por exemplo. Ainda assim, a literatura especializada em lingüística cita apenas o legado sírio-libanês, dos primórdios dessa migração, de modo que qualquer afirmação sobre a contribuição de imigrantes árabes e/ou muçulmanos ao sistema lexical da variedade americana da língua portuguesa é precipitada, seja pela possível desatualização dos dados, dada a falta de pesquisas nas áreas de contato luso-árabe mais intenso (PR, RS), seja pelo fato de a literatura especializada datar já de algumas décadas.
Assim, com os dados de que dispomos agora, e a partir dos arabismos registrados no Léxico Português de Origem Árabe (VARGENS, 2007), temos que apenas 12 vocábulos são empréstimos tomados ao árabe dos imigrantes sírio-libaneses, contribuição esta que perfaz 1,56 % dos arabismos documentados na referida obra. Todos integram o campo semântico da culinária (baba hanuche, beleua, cafta, esfiha, falafel, homos, laban, labna, mijadra, quibe, tabule, tahine).
O Léxico Português de Origem Árabe (VARGENS, 2007) registra, além da herança afro-muçulmana e sírio-libanesa, outros 732 arabismos chegados ao Brasil com a língua do colonizador, o português europeu, e que constituem 96,75% do total dos registros.
Vejamos agora os campos semânticos em que, segundo diferentes estudiosos da língua portuguesa, organizam-se os arabismos portugueses. Considerando-se os campos citados por Elia (ELIA, 2004, p. 107), Houaiss (HOUAISS, 1986), Silva (SILVA, 2003), Silva Neto (SILVA NETO, 1988, p. 333), Teyssier (TEYSSIER, 2001, p. 22), Vargens (VARGENS, 2007, p. 221-225) e Vasconcelos (1956, p. 301-302), encontra-se o referido vocabulário nos campos semânticos de:
1. técnicas e produtos agrícolas: açude, almuinha, safra, sega; açúcar, café, tamarindo.
2. guerra e vida militar: alferes, algema, almirante, arrais, arsenal, bodoque, calibre, refém.
3. indústria e comércio: açougue, alambique, armazém, azenha, azêmola.
4. administração e finanças: aduana, alfândega, alvará, aval, leilão, tarifa.
5. profissões: alfaiate, almoxarife, magarefe.
6. ciências, técnicas e artes: algarismo, álgebra, zero; achaque, elixir, enxaqueca, nuca, xarope; alquimia; alaúde, atabaque, atambor, axabeba, cifra.
7. vestuário: babuche.
8. alimentação e culinária: almôndega, cuscuz.
9. compartimentalização espacial e acidentes geográficos: aldeia, arrabalde, bairro, rincão.
10. habitação e vida doméstica: alcova, alicerce, almofada, andaime, azulejo, chafariz, divã, saguão, sofá, taça, taipa.
11. fauna (inclusive pesca): anta, atum, gazela, girafa.
12. jogos: xadrez.
13. religião: imame, ulemá, mussurumim, islame, jihad, mesquita, minarete, moçafo, tecebá.
Observa-se a presença de vocábulos de origem árabe em ampla gama de áreas nas quais a cultura muçulmana deixou traços. Segundo Houaiss (HOUAISS, 1986), das cerca de 3200 palavras existentes no português primitivo, 2300 seriam herança latina, 800 seriam arabismos e apenas 106 resultariam de empréstimos germânicos. Vasconcelos reitera a importância numérica e “cultur-histórica” desses arabismos, em suas palavras os mais “notáveis” entre os elementos não latinos da língua portuguesa (VASCONCELOS, 1956, p. 299).
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VIAS DE INGRESSO
Verificam-se arabismos em todas as línguas neolatinas, principalmente no espanhol e no português, mas também no italiano e no francês, podendo a sua integração ao sistema léxico de outras línguas (românicas ou não) ter se dado posteriormente por intermédio de uma língua em que estes abundassem. Esse é o caso do galego, por exemplo, em que alguns arabismos parecem proceder da época da invasão, mas a maioria penetrou na língua a partir do século XIII, por meio do espanhol (GARCÍA DE DIEGO apud BALDINGER, 1963, p. 54-55); é o caso ainda do romeno, cujos arabismos foram adquiridos através do turco (LÜDTKE, 1974, p. 84).
Já os portos mediterrâneos de Gênova, Pisa e Veneza e o domínio árabe na Sicília e na Calábria foram vias de entrada de arabismos no italiano e no francês (LÜDTKE, 1974, p. 84).
Segundo Lüdtke, quatro foram as vias de entrada de arabismos nas línguas européias, apresentadas aqui conforme a sua importância:
a) a presença muçulmana na Península Ibérica e em pequena parte do sul da França;
b) o comércio através do Mediterrâneo, sendo os portos de Gênova, Pisa e Veneza importantes vias de acesso para empréstimos árabes;
c) o domínio árabe na Sicília e na Calábria;
d) o domínio islâmico na Turquia; através do turco, vários arabismos penetraram na România, principalmente no romeno.
A estas vias de ingresso de arabismos na România há de se acrescer outras: Vargens cita a expansão portuguesa pelo norte da África e pela Ásia, além de influxos realizados por afro-muçulmanos e por imigrantes árabes no português do Brasil. Viguera Molins observa que o número de arabismos decorrentes de contatos coloniais entre línguas peninsulares e a árabe em vários territórios é menor, embora a língua portuguesa apresente mais arabismos do que as “irmãs peninsulares” tomados a partir do século XVI (VARGENS, 2007, p. 27; VIGUERA MOLINS, 2002, p. 6).
Modernamente, seria necessário incluir a imprensa, a indústria do entretenimento (cinema, canais pagos de televisão), o mercado literário, as novas tecnologias da comunicação e da informática como inegáveis fontes de aprendizagem de vocábulos árabes por lusofalantes.
Na Idade Média ibérica, a maioria dos arabismos se transmitiu, no caso do português e do espanhol, oralmente, no contato direto entre hispano-godos, habitantes das regiões conquistadas, e muçulmanos; moçárabes e muçulmanos e, enfim, moçárabes e demais cristãos. Esta transmissão oral justificaria a aglutinação do artigo árabe ao substantivo que o segue.
Entretanto, boa parte dos arabismos (termos científicos, sobretudo) se transmitiu através do próprio latim medieval, a que havia chegado por meio das traduções latinas (feitas a partir do século XII) de textos árabes. Nestas traduções, de que geralmente tomavam parte três homens, jamais se seguia o caminho direto árabe-latim medieval, fazendo-se antes o percurso árabe-romance hispânico-latim medieval (leitura de texto escrito-versão oral-fixação por escrito). Este processo, que traz a oralidade como ponte nas traduções do árabe para o latim medieval, fez com que também nestas se encontre um grande número de palavras árabes com o artigo aglutinado. Vale lembrar que muitas palavras árabes introduzidas através destas traduções tornaram-se parte da nossa terminologia internacional (LÜDTKE, 1974, p. 85; HALL JR, 1971, p. 98; VIGUERA MOLINS, 2002, p. 6).
A interferência entre as línguas árabe e românicas se dá, portanto, no âmbito do contato lingüístico, mas também sócio-histórico-cultural, e seu estudo, contextualizado na sócio-história do período em questão, torna-se mais rico e elucidativo.
Referências
BALDINGER, K. Los árabes. In: BALDINGER, K. La formación de los dominios lingüisticos en la Peninsula Ibérica. Madrid: Gredos, 1963. p. 53-75. [Biblioteca Románica Hispánica, Dirigida por Damaso Alonso, Tratados y Monografias, 1]
ELIA, S. Preparação à lingüística românica. Rio de Janeiro: Acadêmica, 1974.
JACQUART, D. A escola de tradutores. In: CARDAILLAC, L. (org.). Toledo – séculos XII e XIII: muçulmanos, cristãos e judeus – o saber e a tolerância. Trad. por Lucy Maragalhães. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1992. p. 155-167. (Memória das Cidades)
LAPESA, R. Los árabes y el elemento árabe en español. In: LAPESA, R. Historia de la lengua española. Prólogo de Ramón Menéndez Pidal. 9. ed. corregida y aumentada. 7. reimpressión. Madrid: Gredos, 1991. p. 129-156. [Biblioteca Românica Hispânica, Dirigida por Damaso Alonso, Manuales, 45]
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MENÉNDEZ-PIDAL, R. Mis paginas preferidas: estudios lingüísticos e historicos. Madrid: Gredos, 1957. p. 183-206. (Biblioteca Románica Hispánica, dir. por Dámaso Alonso, VI. Antologia Hispánica).
MENÉNDEZ-PIDAL, R. Orígenes del español: estado lingüístico de la Península Ibérica hasta el siglo XI. 3. ed. muy corregida y adicionada. Madrid: Espasa Calpe, 1950. p. 415-440. (Obras Completas, v. VIII).
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WARTBURG, Walther von. La fragmentación lingüística de la Románia. Trad. por Manuel Muñoz Cortés. Madrid: Gredos, 1952. p. 184-186. (Biblioteca Románica Hispánica, dir. por Dámaso Alonso, I. Tratados y Monografias, 1).
Já os portos mediterrâneos de Gênova, Pisa e Veneza e o domínio árabe na Sicília e na Calábria foram vias de entrada de arabismos no italiano e no francês (LÜDTKE, 1974, p. 84).
Segundo Lüdtke, quatro foram as vias de entrada de arabismos nas línguas européias, apresentadas aqui conforme a sua importância:
a) a presença muçulmana na Península Ibérica e em pequena parte do sul da França;
b) o comércio através do Mediterrâneo, sendo os portos de Gênova, Pisa e Veneza importantes vias de acesso para empréstimos árabes;
c) o domínio árabe na Sicília e na Calábria;
d) o domínio islâmico na Turquia; através do turco, vários arabismos penetraram na România, principalmente no romeno.
A estas vias de ingresso de arabismos na România há de se acrescer outras: Vargens cita a expansão portuguesa pelo norte da África e pela Ásia, além de influxos realizados por afro-muçulmanos e por imigrantes árabes no português do Brasil. Viguera Molins observa que o número de arabismos decorrentes de contatos coloniais entre línguas peninsulares e a árabe em vários territórios é menor, embora a língua portuguesa apresente mais arabismos do que as “irmãs peninsulares” tomados a partir do século XVI (VARGENS, 2007, p. 27; VIGUERA MOLINS, 2002, p. 6).
Modernamente, seria necessário incluir a imprensa, a indústria do entretenimento (cinema, canais pagos de televisão), o mercado literário, as novas tecnologias da comunicação e da informática como inegáveis fontes de aprendizagem de vocábulos árabes por lusofalantes.
Na Idade Média ibérica, a maioria dos arabismos se transmitiu, no caso do português e do espanhol, oralmente, no contato direto entre hispano-godos, habitantes das regiões conquistadas, e muçulmanos; moçárabes e muçulmanos e, enfim, moçárabes e demais cristãos. Esta transmissão oral justificaria a aglutinação do artigo árabe ao substantivo que o segue.
Entretanto, boa parte dos arabismos (termos científicos, sobretudo) se transmitiu através do próprio latim medieval, a que havia chegado por meio das traduções latinas (feitas a partir do século XII) de textos árabes. Nestas traduções, de que geralmente tomavam parte três homens, jamais se seguia o caminho direto árabe-latim medieval, fazendo-se antes o percurso árabe-romance hispânico-latim medieval (leitura de texto escrito-versão oral-fixação por escrito). Este processo, que traz a oralidade como ponte nas traduções do árabe para o latim medieval, fez com que também nestas se encontre um grande número de palavras árabes com o artigo aglutinado. Vale lembrar que muitas palavras árabes introduzidas através destas traduções tornaram-se parte da nossa terminologia internacional (LÜDTKE, 1974, p. 85; HALL JR, 1971, p. 98; VIGUERA MOLINS, 2002, p. 6).
A interferência entre as línguas árabe e românicas se dá, portanto, no âmbito do contato lingüístico, mas também sócio-histórico-cultural, e seu estudo, contextualizado na sócio-história do período em questão, torna-se mais rico e elucidativo.
Referências
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SILVA NETO, S. da. História da língua portuguesa. 5. ed. Rio de Janeiro: Presença, 1988.
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O PROBLEMA DA QUANTIFICAÇÃO DOS ARABISMOS PORTUGUESES
Tomando o léxico português de origem árabe para abalizar a interação das línguas árabe e portuguesa em diferentes fases da história desta última, é importante trazer à tona a velha questão da quantificação deste vocabulário:
Segundo Coelho, há, no máximo, 300 arabismos na língua portuguesa (COELHO apud VASCONCELOS, 1956, p. 299), ao passo que Lopes considera a existência de 400 a 1000 arabismos portugueses (LOPES apud BALDINGER, 1963, p. 54); Ribeiro cita a cifra de 600 vocábulos portugueses de origem árabe, dos quais 2/3 seriam de uso comum (RIBEIRO, 1987, p. 39-40); Nascentes registra 609 arabismos em seu Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa (ELIA, 2004, p. 106); Vasconcelos afirma haver mais de 1000 arabismos na língua portuguesa, número aumentado para mil e tantos, se considerados vocábulos em desuso (VASCONCELOS, 1956, p. 299); Teyssier também crê haver cerca de 1000 arabismos na língua portuguesa, concordando com Machado, que documentou 954 deles na obra Influência Arábica no Vocabulário Português (TEYSSIER, 2001 [1997], p. 22); Franca aponta a existência de mais de 1000 vocábulos portugueses de origem árabe, dos quais apenas 200 ainda seriam bastante usados (FRANCA, 1994, p. 21); Vargens levanta 769 arabismos no Léxico Português de Origem Árabe, mas abordou mais de 3000 em sua tese de doutorado (VARGENS, 2007; VIGUERA MOLINS, 2002, p. 9). Extrapolando o domínio lingüístico português, temos Elcock, segundo o qual havia 4000 arabismos no ibero-romance, muitos dos quais hoje já teriam caído em desuso (ELCOCK apud ELIA, 1974, p. 109), mas Lapesa afirma haver mais de 4000 arabismos no espanhol, sem especificar se a cifra inclui arcaísmos e/ou cultismos (LAPESA, 1991, p. 97), e Piel afirma originar-se na língua árabe 8% do léxico espanhol (PIEL, 1989, p. 10).
Tal divergência quanto ao número de arabismos portugueses (aqui mencionados, a título de referência, os espanhóis, dado que ambas as línguas compartilham parte de sua história) resulta dos critérios utilizados no seu levantamento, como a inclusão do vocabulário de variedades diacrônicas ou diafásicas descritas ou, ainda, a consideração de formas derivadas.
Referências
BALDINGER, K. Los árabes. In: BALDINGER, K. La formación de los dominios lingüisticos en la Peninsula Ibérica. Madrid: Gredos, 1963. p. 53-75. [Biblioteca Románica Hispánica, Dirigida por Damaso Alonso, Tratados y Monografias, 1]
CORRIENTE, F. Diccionario de arabismos y voces afines en iberorromance. 2. ed. ampl. Madrid: Gredos, 2003. [Biblioteca Románica Hispánica, Fundada por Dámaso Alonso, Diccionarios, 22]
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Segundo Coelho, há, no máximo, 300 arabismos na língua portuguesa (COELHO apud VASCONCELOS, 1956, p. 299), ao passo que Lopes considera a existência de 400 a 1000 arabismos portugueses (LOPES apud BALDINGER, 1963, p. 54); Ribeiro cita a cifra de 600 vocábulos portugueses de origem árabe, dos quais 2/3 seriam de uso comum (RIBEIRO, 1987, p. 39-40); Nascentes registra 609 arabismos em seu Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa (ELIA, 2004, p. 106); Vasconcelos afirma haver mais de 1000 arabismos na língua portuguesa, número aumentado para mil e tantos, se considerados vocábulos em desuso (VASCONCELOS, 1956, p. 299); Teyssier também crê haver cerca de 1000 arabismos na língua portuguesa, concordando com Machado, que documentou 954 deles na obra Influência Arábica no Vocabulário Português (TEYSSIER, 2001 [1997], p. 22); Franca aponta a existência de mais de 1000 vocábulos portugueses de origem árabe, dos quais apenas 200 ainda seriam bastante usados (FRANCA, 1994, p. 21); Vargens levanta 769 arabismos no Léxico Português de Origem Árabe, mas abordou mais de 3000 em sua tese de doutorado (VARGENS, 2007; VIGUERA MOLINS, 2002, p. 9). Extrapolando o domínio lingüístico português, temos Elcock, segundo o qual havia 4000 arabismos no ibero-romance, muitos dos quais hoje já teriam caído em desuso (ELCOCK apud ELIA, 1974, p. 109), mas Lapesa afirma haver mais de 4000 arabismos no espanhol, sem especificar se a cifra inclui arcaísmos e/ou cultismos (LAPESA, 1991, p. 97), e Piel afirma originar-se na língua árabe 8% do léxico espanhol (PIEL, 1989, p. 10).
Tal divergência quanto ao número de arabismos portugueses (aqui mencionados, a título de referência, os espanhóis, dado que ambas as línguas compartilham parte de sua história) resulta dos critérios utilizados no seu levantamento, como a inclusão do vocabulário de variedades diacrônicas ou diafásicas descritas ou, ainda, a consideração de formas derivadas.
Referências
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CORRIENTE, F. Novedades en le estudio de los arabismos en iberorromance. Revista Española de Lingüística, 26, 1, p. 1-13, 1996.
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MENÉNDEZ-PIDAL, R. Mis paginas preferidas: estudios lingüísticos e historicos. Madrid: Gredos, 1957. p. 183-206. (Biblioteca Románica Hispánica, dir. por Dámaso Alonso, VI. Antologia Hispánica).
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NIMER, M. Influências orientais na língua portuguesa: os vocábulos árabes, arabizados, persas e turcos (etimologia, aplicações analíticas). Coordenação editorial de Carlos Augusto Calil. 2. ed. revista. São Paulo: EDUSP, 2005.
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ANTIGA PRESENÇA NA LP
Considerando-se o fim do Império Romano em 476; a chegada, em 711, dos muçulmanos ao território que antes constituía a antiga província Hispania; a data de um dos primeiros documentos em língua portuguesa, o Testamento de Afonso II, de 1214, e a expulsão dos muçulmanos das terras hoje portuguesas em 1249/1253, tem-se que muito cedo e por mais de meio milênio o romance hispânico/língua portuguesa esteve em contato direto e sofreu influência da língua do conquistador islâmico.
Elia apresenta, como curiosidade, o registro mais antigo de um arabismo, alvende ou albende, ‘bandeira, flâmula militar’, de 870 (ELIA, 2004, p. 107).
Integração tão precoce levou os vocábulos emprestados a sofrerem as mesmas transformações fonéticas e morfológicas verificadas nos vocábulos latinos em sua evolução para o neolatim (VASCONCELOS, 1956, p. 300), o que, por certo, concorreu para a não percepção da sua origem oriental.
Observe-se que, se os germanismos na língua portuguesa somam 50 vocábulos e os arabismos pelo menos 300 itens lexicais, de imediato se calcula a superioridade numérica destes últimos na razão mínima de 1: 6.
Sendo inequívoca a sua presença no léxico português, pode surpreender o seu uso cotidiano, exemplificados pelos vocábulos a seguir (VARGENS, 2007):
achaque afagar algazarra algema almofada
alvará alvoroço andaime anil argola
armazém azar babucha baque bodoque
cabide cacife café calibre capuz
chafariz debalde divã enxaqueca enxoval
fatia fulano garrafa giz harém
jarra leilão magazine máscara mesquinho
nuca recamar refém resma safeno
soda sofá sucata tabefe taça
taipa talco tara tarefa tarifa
tarimba tripa xadrez xarope zarabatana
Referências
ELIA, S. Preparação à lingüística românica. Rio de Janeiro: Acadêmica, 1974.
FREITAS, T.; RAMILO, M. C.; SOALHEIRO, E. O processo de integração dos estrangeirismos no português europeu. 2003.
LAPESA, R. Los árabes y el elemento árabe en español. In: LAPESA, R. Historia de la lengua española. Prólogo de Ramón Menéndez Pidal. 9. ed. corregida y aumentada. 7. reimpressión. Madrid: Gredos, 1991. p. 129-156. [Biblioteca Românica Hispânica, Dirigida por Damaso Alonso, Manuales, 45]
LÜDTKE, H. Historia del léxico románico. Versión española de Marcos Martínez Hernández. Madrid: Gredos, 1974.
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VASCONCELOS, C. M. de. Lições de filologia portuguesa. Lisboa: Revista de Portugal, 1956.
Elia apresenta, como curiosidade, o registro mais antigo de um arabismo, alvende ou albende, ‘bandeira, flâmula militar’, de 870 (ELIA, 2004, p. 107).
Integração tão precoce levou os vocábulos emprestados a sofrerem as mesmas transformações fonéticas e morfológicas verificadas nos vocábulos latinos em sua evolução para o neolatim (VASCONCELOS, 1956, p. 300), o que, por certo, concorreu para a não percepção da sua origem oriental.
Observe-se que, se os germanismos na língua portuguesa somam 50 vocábulos e os arabismos pelo menos 300 itens lexicais, de imediato se calcula a superioridade numérica destes últimos na razão mínima de 1: 6.
Sendo inequívoca a sua presença no léxico português, pode surpreender o seu uso cotidiano, exemplificados pelos vocábulos a seguir (VARGENS, 2007):
achaque afagar algazarra algema almofada
alvará alvoroço andaime anil argola
armazém azar babucha baque bodoque
cabide cacife café calibre capuz
chafariz debalde divã enxaqueca enxoval
fatia fulano garrafa giz harém
jarra leilão magazine máscara mesquinho
nuca recamar refém resma safeno
soda sofá sucata tabefe taça
taipa talco tara tarefa tarifa
tarimba tripa xadrez xarope zarabatana
Referências
ELIA, S. Preparação à lingüística românica. Rio de Janeiro: Acadêmica, 1974.
FREITAS, T.; RAMILO, M. C.; SOALHEIRO, E. O processo de integração dos estrangeirismos no português europeu. 2003.
LAPESA, R. Los árabes y el elemento árabe en español. In: LAPESA, R. Historia de la lengua española. Prólogo de Ramón Menéndez Pidal. 9. ed. corregida y aumentada. 7. reimpressión. Madrid: Gredos, 1991. p. 129-156. [Biblioteca Românica Hispânica, Dirigida por Damaso Alonso, Manuales, 45]
LÜDTKE, H. Historia del léxico románico. Versión española de Marcos Martínez Hernández. Madrid: Gredos, 1974.
MACHADO, J. P. Ensaios arábico-portugueses. Lisboa: Notícias, 1997.
MACHADO, J. P. Influência arábica no vocabulário português. Lisboa: Revista de Portugal, 1950. v. 1.
MENÉNDEZ-PIDAL, R. Orígenes del español: estado lingüístico de la Península Ibérica hasta el siglo XI. 3. ed. muy corregida y adicionada. Madrid: Espasa Calpe, 1950. p. 415-440. (Obras Completas, v. VIII).
TEYSSIER, P. História da língua portuguesa. Trad. por Celso Cunha. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001. p. 43-44.
VARGENS, J. B. de M. Léxico português de origem árabe: subsídios para os estudos de filologia. Rio Bonito: Almádena, 2007.
VASCONCELOS, C. M. de. Lições de filologia portuguesa. Lisboa: Revista de Portugal, 1956.
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Apresentação
Este blog foi criado para compartilhar informações acerca das conseqüências do contato entre as línguas árabe e portuguesa verificado em 03 contextos específicos: a Península Ibérica medieval, o Brasil escravagista e o Brasil da imigração.
A este tema se dedica a autora deste 1992, quando se apaixonou pelo assunto ao preparar o trabalho de conclusão da disciplina Filologia Românica II (sobre o domínio lingüístico ibérico) na graduação em Letras na Universidade Federal da Bahia.
O referido trabalho, sobre o vocábulo azulejo, descortinou um mundo aparentemente perdido, europeu e medieval, mas que, em verdade, continua vivo no Português Brasileiro, nos arabismos transplantados com o Português Europeu, aos quais se juntaram outros, adquiridos já na Terra Brasilis, por meio de escravos islamizados e de imigrantes arabófonos que ainda hoje chegam ao nosso país.
Os arabismos do Português Brasileiro requerem investigação pautada na etnolingüística e na sociolingüística do contato intercomunitário, complementando o que a literatura especializada já documenta, mas que se restringe aos arabismos ibéricos, mencionando, quando muito, o influxo lexical da migração sírio-libanesa no Brasil.
A este tema se dedica a autora deste 1992, quando se apaixonou pelo assunto ao preparar o trabalho de conclusão da disciplina Filologia Românica II (sobre o domínio lingüístico ibérico) na graduação em Letras na Universidade Federal da Bahia.
O referido trabalho, sobre o vocábulo azulejo, descortinou um mundo aparentemente perdido, europeu e medieval, mas que, em verdade, continua vivo no Português Brasileiro, nos arabismos transplantados com o Português Europeu, aos quais se juntaram outros, adquiridos já na Terra Brasilis, por meio de escravos islamizados e de imigrantes arabófonos que ainda hoje chegam ao nosso país.
Os arabismos do Português Brasileiro requerem investigação pautada na etnolingüística e na sociolingüística do contato intercomunitário, complementando o que a literatura especializada já documenta, mas que se restringe aos arabismos ibéricos, mencionando, quando muito, o influxo lexical da migração sírio-libanesa no Brasil.